Fracassou a ideia da Renda Básica Universal (RBU): um programa de assistência em dinheiro do Estado que não seria apenas para pobres, mas se estenderia a todos os cidadãos (daí “universal”). Um estudo de alto rigor técnico publicado em julho pelo National Bureau of Economic Research (NBER, organização renomada de pesquisa em economia dos EUA) concluiu que a RBU “reduz a participação no mercado de trabalho” e não aumenta a qualidade dos empregos que as pessoas buscam — “podem ser descartadas até pequenas melhorias”, afirmaram os cinco autores liderados pela economista Sarah Miller, da Universidade de Michigan, EUA.
Os pesquisadores descobriram que pessoas que recebem RBU não melhoram suas condições de trabalho com a ajudinha extra. Além disso, elas perdem renda com o tempo, porque reduzem sua participação no mercado. A média das perdas foi de US$ 1.500 ao ano (R$ 8,3 mil na cotação atual). A queda de participação no mercado de trabalho de quem recebeu a renda adicional foi de 2%, os desempregados favorecidos passavam mais tempo nessa condição, e o grupo que continuou empregado enquanto recebia reduziu sua jornada por semana entre 1,3 e 1,4 hora em média. Os ajudados aplicaram seu tempo livre principalmente em lazer, não tanto em aprimorar suas capacidades.
Reações ao estudo
Para Erik Figueiredo, diretor executivo do Instituto Mauro Borges de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos, do governo de Goiás, os resultados não são surpresa. “As discussões são válidas, mas os argumentos contrários à renda básica universal prevalecem”, afirmou o economista em entrevista à Gazeta do Povo.
“O que faz as pessoas prosperarem é a geração e riqueza, não a distribuição pura e simples de um orçamento”, disse Figueiredo. O mesmo vale para o governo em si: “o crescimento econômico tem uma capacidade de aumentar a arrecadação muito mais que o aumento de alíquotas”. Para ele, “o estudo é uma confirmação de algo que eu já esperava que acontecesse”.
Vanessa Brown Calder, diretora de estudos das oportunidades e de políticas de família do Instituto Cato, um think tank libertário americano, disse no X que outros resultados interessantes dos pesquisadores foram que “não houve melhoria na saúde física ou saúde mental” dos favorecidos com a renda extra e que “melhorias quanto ao estresse e à segurança alimentar duraram pouco”. Esses resultados são de um estudo adicional dos mesmos autores, utilizando os mesmos dados.
Alexander Bartik, um dos autores e professor assistente de economia na Universidade de Illinois em Urbana-Champaign, disse que o impacto da renda extra garantida é quase nulo na compra de carros ou casas pelos recipientes. Mais surpreendentemente, “não encontramos evidências de que os lares reduziram suas dívidas”, afirmou.
Athan Koutsiouroumbas, um estrategista político e comentarista que teve uma carreira como chefe de gabinete de republicanos no Congresso americano, disse que pouco foi dito imediatamente após a publicação do estudo “porque as descobertas são assustadoramente ruins” para a ideia da Renda Básica Universal. “A subclasse americana está tão desgastada que, quando se joga um colete salva-vidas para ela, só consegue flutuar em vez de remar por sua própria segurança”, afirmou. Para ele, a grande conclusão é que “o trabalho é ligado de forma intrínseca à dignidade humana, à felicidade e ao progresso”. Receber uma renda garantida do governo é diferente de ser recompensado por trabalhar.
Método de pesquisa
A pesquisa teve o formato de estudo randomizado e controlado. Nesse tipo de estudo, há um grupo de pessoas que recebem o tratamento cujo funcionamento está em análise e outro grupo, chamado grupo controle, não recebe. As pessoas participantes são postas nos dois grupos por sorteio (por isso “randomizado”, aleatório). Daí os resultados para os dois grupos são analisados após o período da intervenção com ferramentas estatísticas. Se os resultados forem idênticos nos dois grupos, pode-se concluir que não é possível afirmar que o tratamento funciona.
O estudo usou 3.000 pessoas dos estados americanos do Texas e Illinois, com idade entre 21 e 40 anos, cuja renda total do lar não excedia o quádruplo do nível de renda considerado o limiar da pobreza nos Estados Unidos em 2019. A renda média dos recrutados antes de receberem RBU foi de aproximadamente US$ 2,5 mil mensais por lar (R$ 16,9 mil considerando a inflação do dólar e a cotação atual).
Uma renda extra de US$ 1.000 (R$ 6,7 mil) por mês foi distribuída para o grupo de tratamento (mil pessoas) por três anos. Foi um aumento substancial de 40% sobre sua renda anterior. O grupo controle (duas mil pessoas) recebeu US$ 50 (R$ 338) por mês.
Um dos poucos efeitos positivos encontrados para a RBU foi que os receptores tinham um incremento no interesse de fazer pós-graduação, mas esse efeito foi pequeno. Eles manifestaram mais interesse em empreender, mas isso não se traduziu em aumento significativo na criação de novos negócios.
noticia por : Gazeta do Povo