VARIEDADES

Quem é o youtuber petista acusado de enriquecer espalhando fake news sobre a direita

O maior influenciador digital da esquerda brasileira é um “forasteiro” que passa longe do estereótipo dos militantes petistas. 

Sempre de camisa colorida, no estilo havaiano, e com um sorriso forjado no branqueamento dental, Thiago dos Reis fala de forma histriônica, refere-se a si mesmo na terceira pessoa e abusa do sensacionalismo para chamar a atenção do público. 

Mais parece um apresentador de programa vespertino da tevê aberta do que um jornalista egresso de redações, professor universitário ou estudante woke (o perfil clássico dos youtubers do chamado campo progressista). 

Mas esse estilo popularesco é justamente a razão de seu sucesso junto aos mais de um milhão e meio de seguidores que o acompanham apenas no YouTube – ele ainda mantém contas “bombadas” em todas as redes sociais, além de um site de notícias. 

Uma audiência jamais atingida pelos intelectuais à frente da comunicação do PT, ainda apegados aos antigos manuais de teor marxista.

Tanto que Reis conseguiu vencer a resistência da esquerda tradicional e sisuda. E há pelo menos quatro anos vem sendo ouvido e cortejado por caciques do PT, entre eles Gleisi Hoffmann e Paulo Pimenta.

Não à toa, foi considerado um dos principais cabos eleitorais de Lula em 2022. 

Gleisi, inclusive, chegou a defendê-lo publicamente nesta semana, após o jornal O Estado de S. Paulo colocar seu nome no centro de uma série de reportagens sobre um suposto “gabinete da ousadia” em atividade no governo. 

Segundo a apuração, a Secretaria de Comunicação do Planalto comanda um grupo de influenciadores que promovem a agenda petista, disseminam fake news e realizam ataques coordenados contra figuras da oposição. 

Ainda de acordo com o Estadão, Thiago dos Reis, participante desse time, é alvo de 15 processos movidos por políticos e empresários ligado à direita que alegam terem sido caluniados ou difamados pelo youtuber. As indenizações, somadas, são da ordem R$ 447 mil. 

Há até um mandado de prisão expedido contra ele, no âmbito de uma ação aberta pelo próprio pai. Declarado interditado em decorrência do alcoolismo e problemas psicológicos, o idoso acusa o filho de abandoná-lo num estado de vulnerabilidade social e insegurança alimentar. 

Oficiais de Justiça tentam encontrar Reis desde 2022, porém o influenciador está sempre se mudando de cidade e até de país (em seus vídeos, ele diz que atualmente vive no México). 

“Hoje a mídia bolsonarista noticia que Thiago dos Reis está foragido e com prisão em aberto. Isso é mentira! O processo a que se referem é do pai dele, que agredia sua mãe. O Thiago poderia pagar três meses de pensão e tirar o pedido de prisão, mas se recusou a fazer. A mentira bolsonarista não para”, afirmou Gleisi Hoffmann em suas redes sociais, escamoteando as outras 15 ações movidas contra seu protegido. 

Ex-blogueiro de futebol criou seu primeiro site político para defender Dilma 

Hoje com 36 anos, Thiago dos Reis foi um dos muitos jovens programadores que iniciaram sua carreira junto com o avanço da internet no Brasil.

Ainda adolescente, começou a criar e monetizar diversos sites de notícias, especialmente sobre esportes – a maioria com nomes genéricos e conteúdos replicados de portais jornalísticos profissionais.

Torcedor fanático do São Paulo, ele mostrou a cara em pelo menos uma dessas páginas: a SPFC.NET, em que entrevistava atletas e dirigentes do clube, com direito a registros fotográficos desses encontros. 

Em 2013, após as Jornadas de Junho, lançou seu primeiro projeto na área política, o site Plantão Brasil, que mais tarde também seria o nome de seu canal no YouTube. 

Contrário ao impeachment da presidente Dilma Roussef, ele pretendia criar um contraponto a movimentos de direita como Revoltados Online e MBL. Na sequência, colocou no ar várias outras páginas semelhantes, como Eu Odeio a Globo e Pig Golpista

De acordo com Reis, seu alinhamento com a esquerda aconteceu de forma natural, comparando os governos de Fernando Henrique Cardoso e Lula. 

Nascido na capital paulista e criado no Guarujá, ele conta que seu pai, “conservador e extremamente racista”, tinha boas condições financeiras até sofrer um baque durante as gestões do PSDB (considerado um partido de direita pelo influenciador). 

De volta à cidade de São Paulo, e já com os pais separados, ingressou na faculdade de Jornalismo. “Graças ao ProUni”, como faz questão de dizer, cursou os semestres iniciais nas instituições particulares Mackenzie e FMU. 

Em seguida, mudou-se para a Espanha, onde continuou estudando por alguns meses e descobriu que “o diploma não fazia diferença nenhuma”. Afinal, já dominava o marketing digital e ganhava dinheiro com isso. 

Durante seu giro pela Europa, conheceu a mulher, a influencer polonesa Joanna Burkat, e com ela voltou para o Brasil. Desde então, não se sabe ao certo em qual cidade do mundo o casal reside. 

Mas, a julgar por seus vídeos, é possível que vivam entre Maceió (onde, segundo Reis, um agente da Abin de Bolsonaro tentou alugar um apartamento em seu prédio) e pequenas localidades no interior da Polônia e na costa do México. 

Youtuber se tornou um modelo a ser seguido pelos comunicadores da esquerda 

Nesse meio tempo, Thiago dos Reis deu o passo que faltava em sua trajetória: sair da sombra e virar comentarista no YouTube. 

Porque, até então, apenas seus sites anônimos eram conhecidos e comentados. Como numa reportagem de 2018 do jornal O Globo, que destacava o Plantão Brasil como principal propagador de fake news após o atentando sofrido por Bolsonaro. 

Desde 2019, quando iniciou o canal, Reis já gravou mais de 10 mil vídeos, todos replicados à exaustão em seus sites e redes sociais.

Em paralelo, tornou-se uma figura combativa no Twitter/X, onde passa o dia defendendo Lula e atacando a oposição em sua conta @ThiagoResiste. “O povão ignora o Twitter, mas todo mundo que é relevante está lá”, diz.

Ou seja, sua estratégia é cercar o público por todos os lados, no máximo de nichos possíveis. E não só na web

Durante a pandemia, ficaram famosos os carros de som e outdoors que ele pagava para divulgar mensagens contra o governo de Jair Bolsonaro em diferentes regiões do país, muitas vezes de forma simultânea. 

Encantados com seu marketing de guerrilha, veículos independentes de esquerda, como DCM, Revista Fórum e Brasil 247, passaram a convidá-lo para participar de lives, nas quais o influenciador mostrava o caminho das pedras de sua comunicação. 

“Precisamos mirar no jovem que ainda não tem título de eleitor e nas milhões de pessoas que não votaram nem no Bolsonaro e nem no Haddad”, “Quem tem verba parlamentar deveria usar esses recursos para criar grupos de WhatsApp, como a direita faz”, “O Bolsonaro tem uma estratégia bem parecida com a minha e se elegeu”, foram alguns dos conhecimentos transmitidos aos pupilos. 

O então deputado federal Paulo Pimenta, um dos primeiros petistas da velha guarda a se envolver com as redes sociais, também se aproximou de Thiago dos Reis. 

Além de compartilhar seus conteúdos (incluindo os baseados em fake news, como no caso da facada em Bolsonaro), Pimenta o convidou para uma live em 2020 e se mostrou bastante interessado pelos ensinamentos do youtuber. No final da conversa, disse que os dois precisavam “conversar mais depois”.

Naquele mesmo ano, Reis esteve numa transmissão com o próprio Lula, durante uma coletiva com outros youtubers de esquerda. Perguntou ao seu recém-libertado ídolo como o PT estava se preparando para falar com os mais jovens, porém recebeu uma resposta difusa. 

Rogério Correia, Carlos Zarattini e Gleisi Hoffmann também estão entre os parlamentares petistas que participaram de debates ao vivo com o dono do Plantão Brasil. Em uma deles, promovido pelo DCM em 2021, Gleisi afirmou que o influenciador era “muito bem-vindo se quiser nos ajudar e orientar”.

No ano seguinte, a presidente do PT apoiou sua candidatura a deputado federal por São Paulo. Problemas burocráticos internos, no entanto, o impediram de concorrer – e ainda hoje ele acredita ter sido sabotado pelo partido, ao qual é filiado desde 2017. 

Reis vem postando mensagens antissemitas desde os ataques do Hamas a Israel

Aliás, há vários setores da esquerda que nunca engoliram o modus operandi do criador do Plantão Brasil. O argumento desses críticos é sempre o mesmo: Thiago dos Reis é somente um oportunista, que ficou rico na internet espalhando fake news e teorias conspiratórias.

E seus alvos não são apenas “inimigos” de Lula, como a família Bolsonaro, o senador Sergio Moro e o empresário Luciano Hang.

Como bem chamou a atenção o influencer “progressista” Rodrigo Kenji, conhecido como Normose, Reis vem divulgando uma série de mensagens de cunho antissemita desde os ataques do Hamas a Israel, em outubro do ano passado.

Em uma dessas postagens, ele afirma que todas as grandes redes sociais e conglomerados de mídia do mundo, com exceção do aplicativo chinês TikTok, são controladas por judeus – uma clara referência aos ‘Protocolos dos Sábios de Sião’, texto usado desde o final do século XIX para acusar a comunidade judaica de confabular para dominar o mundo.

Não há confirmação de que o youtuber receba dinheiro público para dizer esse tipo de barbaridade ou mesmo integrar o “gabinete da ousadia”.

Mas o apoio a uma figura controversa como Thiago dos Reis, vindo de um partido que sempre atribuiu suas derrotas à desinformação, é mais uma prova de que o PT não tem um interesse verdadeiro em combatê-las.

A reportagem da Gazeta do Povo entrou em contato com Thiago dos Reis para solicitar uma entrevista, mas não obteve retorno até a publicação deste texto.

noticia por : Gazeta do Povo

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