Pelo contrário: sua proposta é ser um guia para a conquista da segurança financeira, a partir de parâmetros dos tempos atuais.
Para isso, o professor de negócios Scott Galloway, da Universidade de Nova York, combina conselhos práticos e reflexões filosóficas — como no trecho a seguir, em que aborda a diferença entre viver de acordo com valores sólidos ou ceder às pressões da superficialidade.
Quando descrevemos pessoas que admiramos, as chamamos de “corajosas”, “empreendedoras” ou “inovadoras”.
Todas essas características têm a ver com uma determinada nuance de ação, mais especificamente com pessoas dispostas a ações que se alinham a seus valores, palavras e planos. Como Carl Jung disse: “Você é o que faz, não o que diz que fará”.
Infelizmente, somos bombardeados com mensagens afirmando que existem atalhos para preencher essa lacuna entre intenções e ações.
Ao se preparar para escrever o clássico guia de desenvolvimento pessoal “Os 7 Hábitos das Pessoas Altamente Eficazes”, Stephen Covey não apenas estudou pessoas bem-sucedidas, mas também revisou a literatura sobre como se tornar bem-sucedido. Do período pós-Segunda Guerra Mundial em diante, ele percebeu uma mudança do que chamou de “ética do caráter” para uma “ética da personalidade”.
Obras mais antigas encorajavam os leitores a construir o caráter: promover princípios e valores em si mesmos, construir o sucesso com base em virtudes como a temperança, a diligência e a paciência.
Os conselhos mais recentes, por outro lado, eram centrados em como mudar apenas a própria personalidade: o modo como se apresenta aos outros. Como diz o título do avô desses livros de desenvolvimento pessoal: “Como Fazer Amigos e Influenciar Pessoas”.
Covey escreveu o livro na década de 1980, mas qualquer busca na internet vai apenas confirmar que essa tendência só se acelerou. A mídia social está repleta de life hacks ( já viram algo chamado café com cogumelos?), cantadas para a hora da conquista e outros “truques estranhos”. Cada aspecto de nossa vida tem uma dieta da moda correspondente.
O que mantém o fluxo dos conselhos de ética da personalidade é que eles podem lhe dar um impulso momentâneo, mas não funcionam durante um período significativo ou contra alguma oposição importante. (Um levantamento de 121 estudos descobriu que inúmeras dietas populares, independentemente da teoria que defendessem ou da celebridade que as promovesse, não apresentavam nenhum efeito sobre o peso depois de um ano.)
Assim como os adeptos das dietas da moda inevitavelmente voltam ao peso anterior, essas táticas para o sucesso são apenas isso (táticas, inteiramente enraizadas em um comportamento específico) e não duram.
Se eu lhe contar que o segredo do sucesso é acordar às 5h30, tomar um banho frio e correr 8 quilômetros, não será um mau conselho. Provavelmente você ficará mais focado e produtivo nos dias em que fizer tudo isso. E talvez siga o conselho por alguns dias, ou mesmo, se for altamente disciplinado, por algumas semanas. Mas a novidade passa e a escuridão e o frio matutinos persistem.
Eu passei grande parte da vida profissional perto de pessoas ricas, e algumas acordam mesmo às 5h30, tomam banho frio, etc. Mas não é por isso que elas são bem-sucedidas.
Esses hábitos resultam de uma vida proativa e disciplinada. Caráter e comportamento são indissociáveis. Antigas defesas contra tentações modernas.
As chaves para resistir às tentações
Os estoicos identificaram quatro virtudes: coragem, sabedoria, justiça e disciplina. Eu acredito que essas são as chaves para resistir às tentações (e para muito mais).
A coragem é a nossa persistência, o que os pensadores modernos costumam chamar de “determinação”. Nós temos coragem quando não deixamos o medo guiar nossas ações: medo da pobreza, medo da vergonha, medo do fracasso. Em vez disso, somos trabalhadores, positivos e confiantes.
Os profissionais de marketing são mestres em explorar nossos medos e inseguranças. Ter coragem é mais barato que comprar Chanel, e funciona melhor.
A sabedoria, conforme descrita por Epicteto, é a capacidade de “identificar e desmembrar assuntos para que eu possa dizer claramente a mim mesmo quais deles são externos e não estão sob meu controle, e quais têm a ver com algo que eu posso controlar”.
A justiça é um compromisso com o bem comum, um reconhecimento de que somos interdependentes. O imperador estoico Marco Aurékio acreditava que a justiça era “a fonte de todas as outras virtudes”.
Quando agimos com justiça, somos honestos e levamos em consideração todas as consequências de nossas ações. Nós não temos como construir bons hábitos sozinhos, e o nosso caráter é, em parte, uma função da comunidade.
A disciplina é, para mim, a virtude mais importante, porque é a mais testada pela cultura moderna. O capitalismo é alimentado pela nossa falta de autocontrole, pela nossa obsessão com o status e o consumismo. E não apenas no sentido óbvio de comprar batatas fritas tamanho grande e bolsas luxuosas.
A sociedade ocidental encoraja a indulgência não só nos gastos, mas também nos rompantes emocionais, na vitimização e no vitimismo. Ter disciplina é conseguir resistir a (ou, pelo menos, controlar) todas as nossas indulgências.
O autocontrole como uma maneria natural de ser
Como colocamos essas virtudes em prática? Como construímos o caráter que faz do autocontrole uma maneira natural e intuitiva de ser, e não uma batalha constante contra os impulsos? A gente pode começar indo mais devagar.
Talvez você tome uma centena de decisões moderadamente importantes por dia: o que comer no café da manhã, se deve ir à academia, como responder a uma mensagem atravessada de um colega, o que fazer no fim do dia quando o tempo finalmente pertencerá apenas a você.
É da natureza humana tomar essas decisões de forma reativa, sem pensar, com base no instinto ou na emoção. Essa é a maneira mais rápida.
Em retrospecto, nós tendemos a atribuir nossa resposta às condições — deixamos de tomar o café da manhã porque estávamos atrasados, escrevemos uma resposta dura porque a mensagem não tinha sido razoável.
Lembre-se da virtude estoica da sabedoria: saiba o que você pode controlar. É fácil traçar essa linha, como O imperador estoico Marco Aurélio acreditava que a justiça era “a fonte de todas as outras virtudes.”
O psicólogo Viktor Frankl observou: “Entre o estímulo e a resposta, há um espaço. Nesse espaço está nosso poder de escolher nossa resposta. Em nossa resposta, reside nosso crescimento e nossa liberdade”.
Nós não somos capazes de controlar nosso ambiente, mas conseguimos controlar como reagimos a ele. Se você conseguir encontrar esse espaço que Frankl descreve em apenas algumas daquelas centenas de decisões que toma todos os dias, e levar em conta seus valores e o plano que estabeleceu para si mesmo, você vai criar força para a próxima vez.
Mesmo que seja apenas uma vez por dia, dizer “Eu controlo isto, a minha resposta é escolha minha” e escolher o comportamento que você sabe ser o certo, em vez de ceder àquela sensação do momento, são um passo no caminho para o estoicismo.
Isso não significa nunca ficar com raiva — eu, por exemplo, fico com raiva com frequência, até demais. Nem significa nunca ficar desanimado, frustrado ou envergonhado. Essas são respostas humanas normais a contratempos e erros.
O objetivo é reconhecer a raiva ou o medo (ou a ganância), mas não permitir que isso determine seu comportamento. Caráter e comportamento podem criar um ciclo que se reforça. Comece com apenas alguns comportamentos escolhidos, e você construirá o caráter para fazer mais.
noticia por : Gazeta do Povo