VARIEDADES

Pessach: a liberdade está ameaçada, mas um povo ainda a celebra

A liberdade está ameaçada — não faltam exemplos. Na República de Camarões, quem pensa diferente do governo pode ser preso ou desaparecer. Na Rússia não é diferente. No Irã, quem discorda do governo é enforcado em guindastes nas praças públicas. Nas Américas, Venezuela, Cuba e Nicarágua cerceiam o pensamento e as liberdades individuais. Até mesmo no Brasil, ao arrepio da constituição, magistrados limitam direitos e punem quem se atreve a emitir pensamentos que não os agradam.

Woodrow Wilson, o 28º presidente dos EUA disse: “A liberdade nunca veio do governo. A liberdade sempre veio dos que colocam os políticos no poder. A história da liberdade é uma história de limitações do poder governamental, não de seu aumento”. Infelizmente lideranças autoritárias buscam cada vez mais incrementar seu poder.

E é neste mundo conturbado que, na noite desta segunda-feira (22), os judeus em todo o mundo se reuniram ao lado de uma mesa comemorando o Pessach, a Páscoa Judaica — uma comemoração da liberdade que se repete há mais de 3300 anos. A famosa tela “A Última Ceia”, de Leonardo da Vinci, retrata exatamente a comemoração de Pessach por Jesus e seus discípulos.

Façamos uma reflexão. O Pessach comemora a libertação do povo judeu da escravidão para a liberdade, das trevas para a luz. Muitos povos e nações também comemoram sua independência — mas de forma muito diferente. Uns fazem grandes desfiles militares para demonstrar sua força e poder. Outros estouram fogos de artifício com festa e bebidas. Os judeus, entretanto, sentam-se ao redor de uma mesa e recontam a mesma história, lendo sempre o mesmo roteiro, ano após ano, da mesma forma. Por quê?

Creio que se deve a uma peculiaridade. A liberdade dos judeus ocorrida na Páscoa não foi só física, nem só nacional. Houve também a libertação espiritual, a aceitação de um D-us único que impôs limites, deu-lhes esperança e uma missão. Uma difícil missão, a de trazer ao mundo a mensagem de ética, de tolerância, de aceitação — mensagem que o mundo não quis e não quer ouvir: que todos descendem de Adão e Eva, portanto devemos nos tratar como irmãos, que todos têm direito a um dia de folga, que a justiça tem de ser igual para todos. Afinal, ninguém é melhor ou mais importante, todos saímos do mesmo útero.

Mas o mundo não quer ouvir essa mensagem. Nunca quis. E, em vez de ignorar a mensagem, o mundo optou por perseguir o mensageiro, matar, converter, aniquilar.

Os últimos meses têm sido especificamente difíceis para judeus em todo o mundo. Em Israel, terroristas do Hamas cometeram atrocidades equiparáveis às cometidas pelos nazistas ao matar, degolar, queimar vivos, estuprar e até assar bebês em fornos caseiros frente a seus pais. Terroristas oriundos da Faixa de Gaza (Hamas, Jihad Islâmica e outros) querem acabar com a liberdade de judeus e cristãos em Israel, a Terra Santa. O mesmo desejo é compartilhado por terroristas do Hezbollah no Líbano, das milícias xiitas da Síria e do Iraque, dos aiatolás do Irã e dos arquiterroristas houtis do Iêmen.

Mundo afora, franceses, holandeses, brasileiros, norte-americanos e cidadãos de muitos outros países são perseguidos, humilhados e até esfaqueados por processarem a fé judaica. Sinagogas, escolas judaicas, clubes e instituições da comunidade judaica precisam ser monitoradas e guardadas sob pena de sofrerem ataques, incêndios, tiros e outras formas de violência.

Os humanos são diferentes entre si — cor, raça, fé, nação, valores. Mas as diferenças não devem e não podem nos transformar em inimigos. Temos juntos, todos, a obrigação de criar um mundo melhor, mais tolerante, menos egoísta, mais sensível. Enfim, um mundo mais livre com total liberdade de crença política e religiosa, liberdade de pensamento e de imprensa, liberdade de culto e de opinião.

O ritual judaico do Pessach inclui o vinho, e uma passagem que merece ser mencionada é a obrigação de derramar um pouco do vinho dos copos. O motivo? O vinho tem conotação de felicidade, júbilo. Mas houve um povo que sofreu para que os judeus fossem libertos. Não é permitido aos judeus o júbilo completo, já que seres humanos sofreram para que atingissem sua liberdade, portanto o copo não estará cheio.

O sofrimento do outro, ainda que seja quem nos persegue, nos escraviza e nos humilha, precisa ser sentido. Esta não é uma mensagem só para os judeus, deveria ser universal.

A grande mensagem de Pessach é o imperativo de fazermos parte de um mundo que algum dia chegará à paz e compreensão.

Então se cumprirá a profecia de Isaías: “o lobo habitará com o cordeiro e o leopardo se deitará ao lado do cabrito … um povo não levantará sua espada sobre outro povo e não aprenderão mais a guerra”

Marcos L. Susskind é ativista comunitário, palestrante, guia de turismo em Israel e autor do livro “Combatendo o Antissemitismo”

noticia por : Gazeta do Povo

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