VARIEDADES

Estatísticas de morte materna usadas por defensores do aborto nos EUA são falsas, sugere análise

Depois que a Suprema Corte dos Estados Unidos reverteu em
2022 sua decisão de ativismo judicial dos anos 1970 que liberou o aborto em
todo o país, 64% de obstetras e ginecologistas americanos disseram que a
mudança aumentaria a mortalidade das gestantes, informou uma pesquisa da
empresa KFF ano passado. Um novo estudo publicado na semana passada (12) na AJOG,
sigla em inglês para a Revista Americana de Obstetrícia e Ginecologia, lança
sérias dúvidas sobre essa opinião ao mostrar que os números oficiais de morte
materna podem estar inflados.

A análise, liderada por Cande Ananth, do Departamento de
Obstetrícia, Ginecologia e Ciências Reprodutivas da Faculdade de Medicina da
Universidade Rutgers, Nova Jersey, foi baseada em dados de todas as mortes no
país no período entre 1999 e 2021. Não compreende a polêmica recente, mas
atinge os métodos usados por trás dos debates. Um relatório de dezembro de 2022
da ONG Commonwealth Fund, por exemplo, que afirmou que os estados
americanos que restringiram o aborto desde 2020 experimentaram 62% a mais de
mortalidade materna comparados aos outros, usa as estatísticas oficiais como
fonte.

De onde vêm os números de morte materna

Os números de mulheres que falecem enquanto grávidas, com a
gravidez registrada como uma das possíveis causas da morte, são mantidos pelo
Centro Nacional de Estatísticas de Saúde (NCHS), que é uma unidade dos Centros
de Controle e Prevenção de Doenças (CDC). As estatísticas sugerem que as mortes
maternas teriam aumentado 144% entre 1999 e 2021 — atingindo o número absoluto
de 3489 (23,6 mortes para cada 100 mil partos de nascidos vivos). “Morte
materna” é definida como o óbito “de uma mulher enquanto grávida ou dentro de
42 dias desde o fim da gestação… por qualquer causa relacionada ou agravada
pela gestação ou seu cuidado”. Se a mulher morrer após esse período, dentro de
um ano, inclusive em acidentes, o órgão estatal chama de “morte associada à
gravidez”.

Os autores do estudo contam que o NCHS introduziu em 2003 um
novo item de “gestação positiva” para marcação em um formulário de registro de
óbito. Isso levou a casos como o de 147 mulheres falecidas acima dos 85 anos registradas
como grávidas em 2013. O centro estava ciente do problema e fez ajustes em suas
diretrizes, como restringir a idade das registradas entre 15 e 44 anos. Não foi
suficiente, diz a análise.

Quando usaram um filtro alternativo para os dados que exige ao menos uma menção de gestação entre as causas imediatas, subjacentes ou indiretas das mortes na certidão de óbito, em vez de apenas a marcação do item no formulário, os cientistas descobriram que os números oficiais continuavam superestimando as mortes maternas, apesar das correções introduzidas pelo NCHS. O número oficial é mais que o dobro do número obtido com o método alternativo, que sugeriu 10,4 mortes por 100 mil partos de nascidos vivos. As mortes maternas não são as líderes entre óbitos de mulheres entre 15 e 44 anos.

A análise conclui que, em vez de ter subido o número de
mortes maternas, na verdade há uma estabilidade no período de duas décadas,
mantendo taxas baixas. O número de mortes de gestantes atribuíveis a “causas
obstétricas”, como hemorragia e pré-eclâmpsia (complicação por causa de pressão
arterial elevada), na verdade teria caído entre 1999 e 2021. Uma exceção
observada foi um aumento nas mortes maternas por complicações específicas na
placenta, o que é consistente com um aumento no uso das cirurgias cesarianas
nos Estados Unidos.

Reação dos CDC

Em declaração ao site especializado em saúde Healthline,
um porta-voz dos CDC disse que “os métodos usados na análise da revista AJOG
são conhecidos por produzir uma subcontagem substancial da mortalidade
materna”. Ele defendeu o item para marcação rápida no formulário de óbito. “Incluir
essas mortes maternas que de outra forma não seriam registradas é crucial para
entender a extensão da mortalidade materna nos Estados Unidos”, disse o
representante.

Em nota, o editor-chefe da AJOG, Roberto Romero, defendeu o
estudo por “chamar a atenção para a necessidade de melhorar a vigilância nos
Estados Unidos” e afirmou que os autores são um “grupo distinto de
epidemiologistas e obstetras”.

Para Amanda Costa, advogada especialista em Direito Médico e da Saúde, não é a primeira vez que os CDC são submetidos escrutínio público por problemas em estatísticas de mortalidade. “Caso similar foi quando algumas mortes por Covid e suas informações em certidão de óbito foram questionadas”, relata, “sendo que às vezes sequer havia relação da morte com a doença pandêmica”. Para ela, o estudo da AJOG é “sério” e “reflete lucidez” quando menciona o item de marcação de gravidez. Para ela, o Brasil faz melhor ao ter estabelecido “um campo específico para morte de mulheres em idade fértil, visando estudo de mortalidade materna, o que não quer dizer que houve óbito durante a gravidez, no parto ou pós-parto”.

noticia por : Gazeta do Povo

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