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Gilberto Cattani é Deputado Estadual e Pequeno Produtor Rural (tirador de leite).
O sucesso da colonização e da reforma agrária nas regiões norte e centro-oeste do Brasil, na década de 70 e início dos anos 80, se deveu em grande parte à atuação do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), e pelo fato de que o Governo brasileiro cumpria o que prometia aos assentados que entravam no programa de colonização e reforma agrária.
Um Projeto de Assentamento Rural (PA) passa por várias etapas até a sua implantação final, com a entrega do título definitivo de propriedade da terra ao assentado pelo Incra; essa entrega confirma o êxito do projeto de assentamento com a emancipação econômica dos colonos – a entrega do título é um dos objetivos da reforma agrária, porque implanta a dignidade humana além de impulsionar a economia.
Importante esclarecer que a terra (parcela) não é dada pelo Governo Federal, mas comprada pelo assentado através de um contrato de assentamento, onde ele se compromete a cumprir determinadas condições – por exemplo, a parcela de terra contratada é inegociável pelo prazo de (10) dez anos, nos termos do art. 189 da Constituição Federal; isto é, do início de um assentamento até a fase de entrega de um título definitivo, já se passaram (em tese) dez anos da vida do assentado, onde ele provou a resiliência e aptidão necessárias para permanecer na terra.
Vejam a importância da entrega do título definitivo de propriedade no exemplo da cidade de Lucas do Rio Verde/MT, hoje com mais de 80 mil habitantes, que tem como marco fundacional um assentamento do Incra, porém, naquela época, tão logo que os assentados cumpriam com sua parte do contrato de assentamento – permanecer nos lotes sem vender, repassar ou arrendar pelo prazo de dez (10) anos, como reza a lei da reforma agrária – o governo federal lhes entregava o título de definitivo de propriedade da terra.
Com efeito, em menos de 40 anos, um modesto PA do Incra tornou-se um polo de agroindústria, modelo de desenvolvimento e qualidade de vida; tudo isso porque os colonos tornaram-se proprietários, podendo acessar crédito e assim seguir o curso da vida com novos projetos e sonhos de trabalho.
Porém, com a ascensão da esquerda no poder (em especial o PT), a primeira mudança nos programas de reforma agrária foi sentida com o esvaziamento do Incra, posto que a política e a execução da reforma agrária foram entregues a sindicatos de viés socialista. Surgem, assim, vários movimentos com fito de dividir a sociedade tal como o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), que defende a ideia de distribuição de renda, mas não faz nada em prol da prosperidade, pelo contrário, incentiva a revolta e a pobreza, incitando o descumprimento da lei com invasões de terra e anarquia.
Os sindicatos, e os movimentos tais como o MST, trouxeram para zona rural pessoas inaptas para o trabalho no campo, os projetos de assentamento do Incra foram transformados em chocadeira de votos (voto de cabresto ideológico), pois o colono (que estava aguardando o transcurso prazo de 10 anos) passou a depender da boa vontade do governo, dos sindicatos e das associações para sobreviver na terra – seja porque não lhe era entregue o título de domínio, seja pela ameaça de retirada da parcela por qualquer motivo ideológico.
Enfim, quem não jurasse a bandeira vermelha, viveria na eminência de ser expulso da terra, pois o título definitivo de propriedade foi transformado em contrato precário de concessão de uso, esse contrato permite que o contemplado use a terra, mas nunca se torne proprietário dela – muito importante dizer que o MST nunca assentou ninguém no Brasil, porque quem assenta o colono é o Incra. Em suma, o colono foi condenado a viver na insegurança jurídica à mercê da vicissitude da política da esquerda, posto que a concessão de uso é, em verdade, um instrumento de chantagem política, brandido ao colono de 4 em 4 anos, quando das eleições.
A aptidão para produzir na terra era o requisito para acessar um imóvel rural da reforma agrária, agora, o critério é o da pobreza e da docilidade do cidadão perante o partido dos trabalhadores e a sua ideologia de esquerda. Desapareceu do campo o colono e surgiu o miserável rural inscrito Cadastro Único (Cad) do Governo Federal – o objetivo do Cad é identificar condição de pobreza e manter o indivíduo nela, sob pena de ser expulso do lote de terra.
As áreas rurais onde haviam assentamentos do Incra foram povoadas por aventureiros, especuladores e agentes políticos de esquerda, por consequência, instalou-se o caos nos assentamentos rurais, notadamente na segunda metade dos anos 90. Os miseráveis urbanos trazidos para campo, com ele não se identificavam e, não sabendo trabalhar na terra, em pouco tempo desistiam do lote com a venda ilegal da posse (digamos assim), não sem antes devastar o imóvel com a retirada de toda a cobertura florestal.
O mercado clandestino de venda de lotes públicos da reforma agrária, criado por essa política deletéria, passou a ser gerido por sindicatos, associações e funcionários do Incra desonestos e inescrupulosos – uma indústria de irregularidades, propinas e lucro com uso indevido dos bens públicos surgiu; esse mercado espúrio de terras faz vicejar outra indústria, a da invasão de terras – o indivíduo vende irregularmente a parcela de terras e, logo em seguida, retornavam aos acampamentos do MST para invadir outra propriedade rural e realimentar esse ciclo perverso. O MST beneficiou-se muito disso, inclusive financeiramente, tornando-se o braço armado da esquerda (o chamado exército do Stédile).
O PT, no poder, retribuía os votos e a ação coordenada de pressão do MST sobre seus adversários políticos com dinheiro público (financiamento de ONGs) e com a nomeação de líderes ou prepostos dos ditos “Sem Terras” nos cargos públicos, em especial no Incra e Ibama – não esqueça que o órgão ambiental federal sempre fez vista grossa à devastação da natureza nos assentamentos; inclusive é moda, agora, a invasão na área de proteção permanente dos assentamentos ainda não regularizados.
O MST se identifica como movimento social, todavia é inegável que em um passado não muito distante, usou ele de extrema violência nas invasões de terra que empreendia de forma coordenada pelo país, tendo destruído experimentos científicos na área da agricultura, a título de protesto, bem como ateado fogo em casas, plantações e matado o gado alheio, quando o PT que governou o Brasil de 2003 até 2016 – fatos notórios!
Não desejo fazer lugar comum de que o MST ou o PT sejam organizações criminosas, mas inegável que, em um dado momento da história recente, governantes do partido dos trabalhadores incentivaram práticas pouco recomendáveis.
A situação se tornou tão dramática que o próprio Supremo Tribunal Federal foi instado a se manifestar e, no Agravo Regimental em Mandado de Segurança n° 32.752, Distrito Federal, Relator. Min. Celso de Mello, em 17.06.2015, ementou que, a INVASÃO DE PROPRIEDADE praticada por trabalhadores rurais reunidos em movimento social organizado é CONSIDERADO ESBULHO POSSESSÓRIO, ou seja, a prática ilícita de violação possessória compromete a racional e adequada exploração do imóvel rural afasta qualquer alegação de DESCUMPRIMENTO DE FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE, e/ou qualquer chance de desapropriação-sanção tal como prevê o art. 184 da CF. Melhor dizendo, o STF colocou a invasão de terras como fato que impede a expropriação da área para fins de reforma agrária – terra invadida não entra na reforma agrária!
Ademais, a coordenação de invasões de terras rurais, inclusive com emprego de violência, perpetrada em todo o país pelo MST e seguramente tolerada pelo Governo Federal do PT, motivou uma necessária reinterpretação do art. 6°, § 7°, da Lei Federal 8.629/1993 pelo STF: “A invasão de imóvel rural compromete a sua produção e frustra a sua função social. Assim, essa área não pode ser desapropriada pelo governo para fins de reforma agrária, uma vez que o artigo 6º, parágrafo 7º, da Lei 8.629/1993, estabelece que a propriedade não deixa de ser produtiva se, por caso de força maior, deixa de apresentar os graus de eficiência exigidos para sua exploração.”.
O estilo de governar o Brasil do PT nos faz concordar com o que fora dito por Sócrates: “As democracias são derrubadas pela desesperada defesa dos proprietários, pois os DEMAGOGOS, tendo de adular a plebe, ameaçam de maneira contínua a propriedade fundiária reivindicando a redistribuição das terras e os capitais impondo as liturgias; além disso, perseguem os ricos tomando como eixo os tribunais (com sicofantismos e denúncias) para lhes subtrair o patrimônio [A política, v, 1304b 20-1305ª 7]” – segundo o Professor Luciano Canfora, no livro, O Mundo de Atenas – tradução Federico Carotti, 1ª ed., São Paulo: Companhia das Letras, 2015, p. 69-70.
A guisa de conclusão, podemos dizer que a política da esquerda – do MST e de outros “movimentos sociais” –, implementadas no campo, nunca criaram benefícios para os agricultores; muito pelo contrário, destruíram a segurança jurídica e o direito de propriedade destes. Os autoproclamados “movimentos sociais”, são em verdade marginais que descumprem a lei e praticam o terrorismo psicológico e político contra os colonos assentados que não possuem título de propriedade, bem como ameaçam de invasão quem já tem o título.
Eu sou um assentado do Incra (Projeto de Assentamento Pontal do Marape em Nova Mutum/MT), meu contrato é do ano de 1999, mas recebi meu título definitivo no ano passado; melhor dizendo, passados 23 anos depois da assinatura do contrato de assentamento é que recebi o título definitivo de propriedade. Enfim, a minha entrada na vida pública se deve ao fato de que cumpri os termos do contrato de assentamento, e, passados dez anos o título definitivo me foi negado por conta de uma ideologia comunista implementada na reforma agrária, em menoscabo da Constituição, Lei e ao Contrato firmado.
Reafirmo aqui tudo o que disse, semana passada, lá na CPI do MST em Brasília, respeito toda liberdade, mas minha atuação política sempre será pautada pela luta pelo que é certo, não admitindo nunca e de forma alguma que pessoa, partido político, uma ideologia e/ou um grupo de paramilitares (do campesinato) assumam, através da intimidação e/ou com uso da força bruta em invasões de terras, o lugar do Estado Democrático de Direito e do império da legalidade – o exército do Stédile não deveria voltar!
Gilberto Cattani é Deputado Estadual e Pequeno Produtor Rural (tirador de leite).
FONTE : ReporterMT