A Village Cepam Indústria de Chocolates e a Cepam Comércio de Alimentos entraram com pedido de recuperação judicial no último dia 23, com dívidas que somam R$ 73,4 milhões. Ambas com sede em São Paulo, as empresas pertencem às famílias que fundaram a Cepam em 1968 e a Village em 1973.
A Village é uma das mais populares fabricantes de bolos, biscoitos e panetones do país, que até 2022 também produzia ovos de Páscoa, enquanto a Cepam, famosa padaria da zona leste paulistana, já foi apontada como a maior da América do Sul, com 2.500 m², espaço que também abriga um amplo restaurante. Juntas, empregam cerca de 600 pessoas.
O pedido de recuperação judicial foi feito pelo escritório Otto Gübel Sociedade de Advogados. Nesta terça (30), o juiz Paulo Furtado de Oliveira Filho, da 2ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais do TJ-SP (Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo), requereu alguns documentos, como o relatório de fluxo de caixa e os valores demandados nas ações trabalhistas, que devem ser entregues em 15 dias.
Na petição, a defesa da Village argumentou que a recuperação judicial é consequência da pandemia de Covid-19 que comprometeu a operação da empresa desde 2020. Até então, informa o advogado Otto Willy Gübel, a empresa não dependia de empréstimos bancários para operar.
“A pandemia do Covid-19 fez com que alguns empréstimos bancários tivessem que ser contraídos pelas requerentes, especialmente para manter seus funcionários ativos e cobrir os custos altíssimos da
operação”, diz a defesa. “Como resultado dos intensos, mas infrutíferos empenhos, o cenário econômico-financeiro da Cepam e da Village Cepam se agravaram vertiginosamente a ponto de ter que procurar, no mercado, o socorro necessário”, informa o texto.
A própria defesa revela, no entanto, que a operação da Cepam durante a pandemia foi destaque: a padaria foi a loja única (sem ser franquia ou rede) que mais vendeu no aplicativo iFood em abril, maio e junho de 2020, com uma média de 1.000 a 1.100 entregas por dia. A empresa, porém, reclama das altas taxas cobradas por aplicativos de delivery, além de revelar que contratou 50 motoboys para atender os pedidos na fase mais aguda da pandemia.
“As requerentes se reinventaram através da adesão aos serviços e aplicativos de entrega, algo que antes não lhes era comum, pois as entregas eram sempre pontuais e realizadas pelo carro próprio. Evidente que tais aplicativos possibilitam um alcance muito maior na demanda, mas também exigem que uma margem alta seja ‘consumida’ para utilização da plataforma”, diz a petição.
“Foram, repentinamente, contratados 50 motoboys, de um dia para a noite, sem, contudo, ter a certeza de que estavam tomando a correta decisão, na medida em que tudo ainda era muito incerto quanto ao prazo que a situação duraria, a agressividade do vírus e a demanda versus oferta do mercado.”
Já a Village, que chegou a fabricar os ovos de Páscoa da Nestlé, informou ter sido duramente afetada com o fechamento dos estabelecimentos 19 dias antes da comemoração de 2020. “Foram centenas de milhares de devoluções de ovos de Páscoa realizadas pelas grandes redes de super e hipermercados de todos os produtos da Village, pois a devastadora maioria das entregas realizadas é na modalidade de consignação, o que gerou um prejuízo gravíssimo para as requerentes”, diz a petição.
Em 2019, por exemplo, a Village tinha vendido R$ 32 milhões só na Páscoa. Em 2020, foram R$ 16 milhões.
Em entrevista à Folha em 2022, o então diretor comercial da Village, Reinaldo Bertagnon, afirmou que a empresa não iria produzir ovos de chocolate aquele ano, a primeira interrupção em 22 anos, por conta do aumento do preço dos insumos, especialmente de embalagens, que tornou a operação inviável.
Ainda assim, a empresa também informou, em 2022, que estava exportando panetones para o Japão. No ano, as exportações em geral responderam por cerca de um quinto do faturamento da Village, não revelado. A companhia também produz panetones para marcas próprias de redes de supermercados.
Na Cepam, são produzidos diariamente cerca de 16 mil pães franceses e 11,2 mil produtos. Aos fins de semana, a padaria recebe aproximadamente 8.000 clientes. A empresa é responsável por kits de lanches de grandes hospitais, como o Albert Einstein, em São Paulo, além de fornecer pão de hambúrguer para a rede de lanchonetes Bob’s, diz a petição.
Se o pedido de recuperação judicial for deferido, as companhias terão 60 dias para apresentar o plano e todas as ações contra elas estão suspensas por 180 dias. A Cepam já teve um pedido de falência distribuído no ano passado –fato que, segundo a defesa, despertou “gatilho” nos demais credores, que recorreram à Justiça.
A Folha tentou contato com João Diogo, filho de um dos fundadores, Antônio Diogo, mas não obteve retorno até o fechamento deste texto. Parentes do outro fundador, Germano Amaro, também são sócias: Vilma Aparecida Blanco Amaro e Vera Lúcia Fiacomelli Amaro. Outra sócia é Hilda Amara Macarrão.
noticia por : UOL