A rede varejista Americanas tem à venda três tipos de pizzas. Seus sabores são: calabresa, quatro queijos e frango com catupiry. Custam entre R$ 16,99 e R$ 18,99. Desde a semana passada, quando a CPI de seu escândalo encerrou suas atividades sem identificar um só responsável pela ruína, a Americanas bem que poderia oferecer a Pizza CPI, sem nada, só com a caixa de papelão.
A fraude cometida na Americanas resultou num pedido de recuperação judicial com uma dívida declarada de R$ 43 bilhões junto a bancos e cerca de 15 mil fornecedores, com prejuízo para pelo menos 146 mil acionistas individuais. É, de longe, a maior quebra corporativa já ocorrida em Pindorama e a CPI acabou em coisa nenhuma.
Tancredo Neves sempre ensinou: “Esperteza, quando é muita, come o dono”.
A CPI caminhava para seu triste desfecho, quando veio uma surpresa: o ex-CEO da Americanas Miguel Gutierrez enviou-lhe uma carta na qual diz que “me tornei conveniente ‘bode expiatório’ para ser sacrificado em nome da proteção de figuras notórias e poderosas do capitalismo brasileiro”.
Fulanizando, os três grandes acionistas da Americanas são: Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira. Na última lista da revista Forbes eles foram colocados como 3ª, 4ª e 5ª pessoas mais ricas do Brasil. Juntos, somam US$ 34,3 bilhões. Segundo Gutierrez, os acionistas sabiam da má situação da empresa e Sicupira acompanhava suas vendas. Não há registro do que soubessem das fraudes.
Gutierrez está na Espanha e é provável que de lá não saia. Ele não depôs na CPI e na sua carta repete que não sabia das fraudes. No caso da Americanas, ninguém sabia de nada. O doutor sabia que em 2022 a empresa ia mal e nada viu de anormal, mas transferiu a propriedade de três imóveis para familiares e em pelo menos uma troca de mensagens deixou em segredo cifras das dificuldades. Durante o segundo semestre de 2022, diretores da empresa venderam 14,1 milhões de ações, num montante de R$ 241,1 milhões, dos quais R$ 150 milhões teriam sido negociados por Gutierrez.
A Pizza CPI pressupõe que a plateia pague pela massa e coma o papelão. Há investigações em curso, até mesmo com delações, e a carta de Gutierrez acendeu um alerta. Não dá para se acreditar que um buraco de R$ 43 bilhões seja coisa de um só bode. Isso é coisa de rebanho.
Diretores da Americanas debocharam da CPI e, quando apareceram, ficaram mudos. Um deles recusou-se a confirmar a autoria de uma mensagem na qual dizia que falar do endividamento da empresa seria “morte súbita”.
O mercado de capitais americano é robusto porque de vez em quando estoura um escândalo e alguns maganos vão para a cadeia. Até agora, o caso das Americanas mostra o predomínio da prepotência. Fornecedores perderam dinheiro, acionistas perderam suas economias, e ninguém sabia de nada.
Aos poucos, parece que Gutierrez saberia de tudo. Ele sabia muito mais do que diz saber, mas muita gente, dentro e fora da companhia, sabia de alguma coisa.
Num espeto de R$ 43 bilhões há chifres demais para um só bode.
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noticia por : UOL