MUNDO

Originalidade transforma aumento do café em dinheiro

Peço licença para citar Lima Barreto, ou melhor, seu personagem Policarpo Quaresma, ao refletir sobre o Brasil: “Tinha todos os climas, todos os frutos, todos os minerais e animais úteis, as melhores terras de cultura, a gente mais valente, mais hospitaleira, mais inteligente e mais doce do mundo —o que precisava mais? Tempo e um pouco de originalidade”.

A originalidade está em falta há 525 anos, quando começamos a exportar nossas commodities e não conseguimos mais trocar de raia pela corrida do crescimento.

Seguindo essa lógica, nos tornamos o maior produtor mundial de café. E agora ele virou uma pedra no sapato.

Vilão na inflação dos alimentos, o preço médio do café torrado e moído nos supermercados foi de R$ 29,62 em janeiro do ano passado para R$ 56,07 por quilo, segundo dados da Associação Brasileira da Indústria de Café (Abic). Quem fizer a regra de três, vai notar que se trata de 90% de aumento em um ano.

Algoz do consumidor, mocinho para os produtores. No ano de 2024, exportamos mais de 50,4 milhões de sacas de café (mais de 3.000 toneladas), um baita recorde, com um aumento de 28% no volume exportado, depois de três anos em queda, conforme publicado pelo Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé).

O aumento do volume, por si só, já parece impressionante. Mas com a disparada do preço da iguaria mundo afora, a receita cambial gerada com nossas exportações no ano passado totalizou US$ 12,5 bilhões (R$ 72 bilhões, na cotação atual). Em relação a 2023, significa um aumento de mais de 55%.

Parece que o preço do grão não chegou a seu limite. Lamento informar, mas a produção do café sofre com a chamada bienalidade, ou seja, os pés são mais produtivos a cada dois anos. E acabamos de sair do “ano de alta”.

Se você ainda acha que crise climática é material para panfletos, veja que somos o maior produtor mundial de café e a última safra, mesmo sendo “de alta”, foi 1,6% menor do que a de 2022/2023. Passamos pela maior seca em 70 anos.

O clima afetou também a produção do segundo maior produtor global, o Vietnã. Por lá, segundo autoridades locais, secas prolongadas e temperaturas elevadas reduziram os rendimentos do campo e afetaram a qualidade das safras.

E como isso afeta suas finanças, além, é claro, de aumentar os gastos diários? Nesta semana conversei com traders experientes, que têm surfado a alta do preço do café através de suas plataformas de investimento (home brokers).

É a pura e velha especulação. Analisam gráficos, tendências e relatórios de produção, estoque e vendas, para apostar que o preço vai subir ainda mais. Compram e vendem contratos das chamadas opções, que dão ao titular o direito de comprar ou vender o produto por determinado preço em uma data definida. Chegando lá, a depender da cotação, decidem se querem ou não realizar o negócio. Na outra ponta, estão outros especuladores e produtores, negociam para se proteger das variações de preço e financiar suas lavouras.

Não é um investimento trivial, os riscos devem ser bem analisados, como em todos os outros casos nos quais seu dinheiro está em jogo. Ainda assim, é uma alternativa a simplesmente reclamar do preço do café no mercado ou na padaria.

Talvez um pouco de “originalidade” nos investimentos ajude a surfar no mundo do dinheiro, enquanto seguimos baseando nossa economia em exportar o que sai da terra.


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noticia por : UOL

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