Jair Bolsonaro assumiu a Presidência em janeiro de 2019. Dois meses depois, atacou a neutralidade das urnas eletrônicas. Em maio, compartilhou uma mensagem que dizia: “A hipótese nuclear é uma ruptura institucional irreversível, com desfecho imprevisível”.
Essa ruptura não podia vir do nada. Ao fim do ano, diante das manifestações ocorridas no Chile, Bolsonaro sacou o que viria a ser seu bordão: “A gente se prepara para usar o artigo 142 da Constituição Federal, que é pela manutenção da lei e da ordem, caso eles [integrantes das Forças Armadas] venham a ser convocados por um dos três Poderes.”
Bolsonaro operava uma manobra de pinça. Numa ponta, brandia o Apocalipse. Noutra, investia contra o Supremo Tribunal Federal e o Congresso. No dia 8 de janeiro a pinça fechou-se. Felizmente, estava torta.
Fora do poder e declarado inelegível, Bolsonaro convocou uma manifestação para domingo (25) em São Paulo. Desde a sua saída do Planalto, o Brasil continua com seus problemas, mas livrou-se de um presidente apocalíptico.
Como cidadão, ele deve avaliar o comportamento de seus aliados. Mensagens coletadas pelo repórter Levy Teles mostram que os maus espíritos do 8 de janeiro continuam lá.
O Laboratório de Humanidades Digitais (LAB-HD) da Universidade Federal da Bahia (UFBA) captou alguns exemplos: “O presidente Bolsonaro está dando um recado: estamos a dias do maior evento de democracia e resgate aos movimentos patrióticos como os 70 dias nos quartéis. Eu estava lá e vocês?”
Ou ainda: “O Brasil vai se levantar. Os motoclubes estão se levantando, o povo está se levantando, caminhoneiros vão se levantar”.
Bolsonaro jura que nunca pretendeu sair das quatro linhas da Constituição e que nada teve a ver com as invasões do dia 8 de janeiro. Acreditando-se nisso, a manifestação do domingo será um teste para que ele se qualifique. Poderá reaparecer como um líder político, ainda que inelegível, ou como um incitador de desordens, um enamorado pelo Apocalipse.
Há 60 anos, nesses dias, o professor San Tiago Dantas dizia que o Brasil tinha duas esquerdas, a positiva e a negativa. Não lhe deram ouvidos. Passado o tempo, o Brasil tem hoje duas direitas. A direita negativa, na qual Bolsonaro sentou praça, perdeu na eleição de outubro e na ilusão de um golpe em dezembro de 2022.
Teatro ridículo
É ridícula a marquetagem segundo a qual o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, estará constrangido à manifestação de Bolsonaro no domingo. Ele quer os votos dos bolsonaristas, nunca criticou um um só ato do ex-capitão. Em outubro passado acompanhou-o numa visita ao batalhão da Rota. Sem os seus votos, mal se elege vereador.
É preferível um gesto de sinceridade: explicita sua vontade de ser votado e, se for o caso, esclarece quais são as suas divergências.
Um título para Braga Netto
O Exército tem vários patronos. O general Osório é o patrono da Cavalaria, Mallet é o patrono da Artilharia, e Sampaio, da Infantaria. Valeria a pena criar o patronato do golpismo palaciano. Ele iria para o general Assis Brasil, que em 1964 coordenava o dispositivo militar do presidente João Goulart.
O mais recente general alistado nessa Arma seria Walter Braga Netto.
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noticia por : UOL