Trata-se de um grupo muito singular esse… Mesmerizados, seus integrantes, pela teoria estúpida da “polarização”, que impediria os brasileiros de ver a verdade revelada, avaliam que, em 2022, 91,63% dos que votaram escolheram a desrazão: 48,43% com Lula e 43,2% com Bolsonaro. “Então o brasileiro é incapaz de fazer escolhas racionais?” Não é isso o que eles querem dizer, vão assegurar. Mas é o que dizem.
TREPANAÇÃO, NÃO CRANIOTOMIA
Antes que avance, uma observação necessária. O presidente Lula se submeteu a uma trepanação, não a uma craniotomia. No primeiro caso, abre-se no crânio um orifício com o trépano, uma espécie de furadeira. No segundo, o corte, a incisão, compreende a ablação (ato de arrancar) um pedaço. Comunicado inicial do hospital falava em “craniotomia”. Daí que eu tenha brincado aqui com o presidente na madrugada de ontem: ninguém vira um mau sujeito por isso. Fiz duas. Alguns podem discordar da minha opinião sobre ser um bom rapaz… É consensual, no entanto, que Lula se submeteu a uma trepanação, não a uma craniotomia. E, pois, trata-se de algo bem menos agressivo. Melhor para ele.
DE VOLTA À POLÍTICA
Lula está sendo amparado por alguns dos melhores neurocirurgiões do mundo. Suas condições gerais de saúde sendo satisfatórias, não há razão para duvidar da sua reabilitação, embora, com efeito, não se trate de um caso de unha encravada. Nesses dias em que vai ficar de molho, algum espírito de renúncia (não à Presidência, claro!, mas às ambições desse mundo louco…) poderia povoar os seus sonhos: “Deixe de lado esse coisa de poder, Luiz Inácio… Tudo isso não passa de ‘vanitas’. E ‘a vaidade é um princípio de corrupção’, como escreveu Machado de Assis (Bentinho), no capítulo XCVII de Dom Casmurro”. No caso, trata-se de corrupção da vontade…
Pois é… Ocorre que esse estoicismo que abre mão das pulsões que nos empurram para os embates não convive com a política. Pode ficar bem em certos filósofos, nos anacoretas ou naqueles que não têm dificuldade nenhuma de abrir mão do que nunca tiveram nem terão. Não é assim com as pessoas que têm sua personalidade e sua individualidade definidas pelos embates públicos. É evidente que não há a menor possibilidade de Lula abandonar a disputa de 2026 se for ele a fazer a escolha, não a sua saúde. E sua história de vida lhe impõe, não como uma pena, mas como uma condição que o define, a disputa. Aquele extremista de centro ansioso de que trato lá nos primeiros parágrafos perca a ilusão.
“Mas, afinal, Reinaldo, a disputa de 2026 ficou mais perto, foi antecipada?” Em que sentido? Não entendo nem a natureza da pergunta. Em que a condição transitória — é o que se tem até agora — de Lula muda o jogo na extrema-direita, por exemplo? Em absolutamente nada! O falso Messias e “vero” Bolsonaro continuará a se dizer candidato e levará adiante o seu pleito, até que o TSE lhe diga o óbvio — não pode se candidatar — e então se verá quem buscará ungir em seu lugar. É seu jogo de poder. Só assim se mantém influente. O Lula que inspira a sua ação é o de 2018, que fez essa trajetória. A direita, enquanto isso, continuará a ser fagocitada pela extrema-direita, incapaz de lançar criar uma figura que tem parecido bastante exótica por aqui: conservadora, democrática e eleitoralmente viável.
Na seara progressista, a menos que Lula anuncie a desistência, coisa que só a saúde (ou falta dela) lhe poderia impor, ninguém dará um passo além da linha. Então se antecipou o quê, além de nada? O que se vê e se lê, aí sim, são especulações que não vão além do “wishful thinking”. São aqueles que acreditam que podem mudar a realidade apenas por virtude do muito imaginar… E, obviamente, não podem.
noticia por : UOL