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Gestão Paes libera R$ 1 mi para Assembleia de Deus no dia em que fechou apoio de deputado evangélico

A gestão Eduardo Paes (PSD) assinou contrato de patrocínio para a celebração do centenário da Assembleia de Deus no Rio de Janeiro no mesmo dia em que o deputado Otoni de Paula (MDB), ligado à denominação, fechou as negociações para apoiar a reeleição do prefeito.

O repasse de R$ 950 mil, assinado no dia 20 de junho, teve como destino um evento realizado dois dias depois. Paes discursou na cerimônia ao lado de Otoni e do bispo Abner Ferreira, que participou das negociações políticas para o apoio.

O contrato, obtido pelo gabinete do vereador Pedro Duarte (Novo), mostra que entre as contrapartidas está o direito a “50 spots de 30 segundos na rádio 93 FM”, emissora gospel do Rio.

Ferreira e Otoni negaram vínculos entre o patrocínio e o apoio. Ambos declararam que não fazem parte da entidade beneficiada com o repasse e que participaram do ato como fiéis da Assembleia, que tem diferentes correntes.

Os dois integram a Assembleia de Deus – Ministério de Madureira. O patrocínio da prefeitura foi dado à Cemad-RJ (Convenção Estadual de Ministros das Assembleias de Deus do Rio de Janeiro), um outro ramo da mesma denominação religiosa. Procurada, a entidade não retornou aos contatos da reportagem.

A prefeitura disse que a autorização do apoio foi dada no início de maio e que “apoia todos os eventos culturais e religiosos que promovam a cidade”.

Paes escolheu Otoni para atuar junto ao eleitorado evangélico, vinculado ao bolsonarismo. O objetivo é tentar disputar a preferência dos fiéis na disputa contra o deputado Alexandre Ramagem (PL), pré-candidato apoiado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Otoni oficializou o fim de sua pré-candidatura no dia 13, quando fez a primeira reunião com Paes sobre a aliança. Uma semana depois, no dia 20, os dois se reuniram e selaram a aliança, em reunião com a participação de Abner Ferreira.

Dois dias depois, os três discursaram juntos no evento organizado pela Cemad-RJ. A cerimônia encenou na zona portuária a chegada dos missionários fundadores da Assembleia de Deus no país.

O processo administrativo que culminou no contrato foi aberto, segundo o sistema da prefeitura, em abril deste ano com a carta proposta da Cemad-RJ. O site do município exibe apenas a movimentação do processo, e não seus documentos.

O sistema da prefeitura mostra que o processo voltou a ter movimentação apenas em 28 de maio. No dia seguinte, o prefeito publicou um decreto remanejando R$ 950 mil da conservação da cidade para a rubrica de apoio a eventos. O texto não define a destinação do recurso, mas se trata do mesmo valor dado ao evento.

Os autos voltam a ser movimentados em 10 de junho. As descrições no sistema indicam ser a inclusão de documentos da Cemad-RJ e detalhamento de custos do evento. A partir do dia 13 de junho, documentos produzidos pela prefeitura começam a ser juntados no processo. Foi a data em que Otoni se reuniu com Paes e decidiu abrir mão da candidatura.

A primeira publicação em Diário Oficial sobre o apoio ao evento sai no dia 19 de junho, quando o secretário da Casa Civil, Lucas Padilha, aprova o plano de trabalho e autoriza a celebração do contrato. O despacho é datado do dia anterior, 18.

O contrato foi efetivamente assinado no dia 20, mesmo dia em que Paes se reuniu com Otoni e Abner Ferreira para discutir o apoio.

Nesse mesmo dia, outro processo de patrocínio para celebrar o centenário da Assembleia de Deus voltou a ser movimentado. Ele se referia ao pedido de apoio da Ceader (Convenção Evangélica das Assembleias de Deus do Estado do Rio de Janeiro), outro ramo da denominação, para evento no sábado (29), no Maracanãzinho. O plano de trabalho de R$ 1,5 milhão foi assinado no dia 24.

De fato, a prefeitura sob gestão Paes costuma apoiar eventos religiosos. Recentemente, concedeu R$ 1,5 milhão para a Marcha para Jesus, organizada pelo Comerj (Conselho de Ministros do Estado do Rio de Janeiro), ligada ao pastor Silas Malafaia. O prefeito, porém, não compareceu ao evento, que contou com a presença de Ramagem e do governador Cláudio Castro (PL).

“Não é de hoje que o prefeito está loteando a prefeitura e dando verbas para grupos políticos, em troca de apoio nas eleições. Esse caso é só mais um deles. A prova de que ele sabe que isso é grave é o fato de o processo, apesar de digitalizado, estar oculto no sistema de transparência para o cidadão comum”, afirmou Pedro Duarte.

A vereadora Teresa Bergher (PSDB) afirmou que vai acionar o Ministério Público e solicitou cópia dos processos para analisar o patrocínio. “Esse patrocínio cheira à compra de apoio eleitoral.”

Repudio a ilação de que meu apoio teve essa condicionante, diz Otoni

O deputado Otoni de Paula negou relação entre o patrocínio dado pela prefeitura para o evento e seu apoio à pré-candidatura. Ele afirmou que o Ministério de Madureira, ramo da Assembleia de Deus da qual faz parte, não aceita recursos públicos.

“Quero repudiar essa tentativa de ilação, como se meu apoio político ao prefeito Eduardo Paes tivesse essa condicionante”, afirmou ele em discurso na Câmara após ser procurado pela reportagem.

“Em nome da verdade, o bispo [Abner] sempre foi contra. Mas como era um evento comum às Assembleias de Deus, acabou entrando. Eu sempre me posicionei contrariamente. Quem quiser marchar para Jesus, que marche com seu dinheiro”, disse Otoni à Folha.

Abner Ferreira disse, por meio de sua assessoria de imprensa, que “desconhece que tenha sido destinado algum patrocínio ou verba pública para o evento”. “A igreja que preside nunca recebeu nenhum recurso público para absolutamente nenhum evento em toda a sua história.”

A prefeitura declarou, em nota, que “apoia todos os eventos culturais e religiosos que promovam a cidade”.

“O centenário da Assembleia de Deus é um acontecimento histórico e que merece ser celebrado. A autorização dos patrocínios foi dada no início de maio”, afirma a nota.

Procuradas, a Cemad-RJ e a Ceader não se pronunciaram.

noticia por : UOL

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