MUNDO

Declaração da CIA reacende busca por resposta sobre origem da Covid

A recente declaração da CIA de que o vírus da Covid-19 provavelmente surgiu de um vazamento de laboratório na China reacendeu uma batalha de cinco anos sobre a origem da pandemia.

Nos últimos anos, várias agências dos Estados Unidos e alguns cientistas propuseram a hipótese do vazamento de laboratório.

Outros especialistas, porém, insistem que há boas razões para pensar que o patógeno surgiu de um mercado em Wuhan onde animais são comercializados.

Pequim nunca cooperou totalmente com investigadores internacionais, dificultando a busca por uma resposta definitiva.

Mas cientistas ainda tentam estabelecer as causas de uma crise de saúde global que matou milhões de pessoas, causou trilhões de dólares em danos econômicos e aumentou os temores sobre os riscos da pesquisa de vírus.

Hoje, qual é o balanço sobre a origem da Covid?

A CIA disse no fim do mês passado ser “mais provável” que o coronavírus Sars-Cov-2 tenha sua origem “relacionada à pesquisa” do que a uma causa natural.

A própria CIA, entretanto, disse ter “baixa confiança” em sua conclusão, anunciada após John Ratcliffe assumir o comando da agência e cobrar que ela se posicionasse sobre as origens do patógeno. A avaliação não deu indicações de ter se baseado em novas informações e resultou de uma revisão ordenada pela administração Biden perto do fim do mandato do democrata.

A declaração da CIA é a mais recente de políticos e agências dos EUA que apoiam a hipótese de vazamento. Alguns republicanos têm usado essa hipótese como parte de uma crítica mais ampla à China.

Pequim, por sua vez, negou que o Instituto de Virologia de Wuhan, um centro líder em pesquisa de coronavírus, ou que o Centro de Controle e Prevenção de Doenças de Wuhan tenha sido a fonte inicial do vírus.

Perguntado sobre a declaração da CIA, o Ministério das Relações Exteriores da China respondeu que os EUA deveriam “parar de politizar e militarizar o rastreamento de origens”.

Em outros países, muitas autoridades ainda não tomaram uma posição sobre as origens da Covid e enfatizam que apoiam os esforços da Organização Mundial da Saúde (OMS) para estabelecê-la.

As relações da OMS com Pequim se deterioraram quando autoridades chinesas não permitiram que a entidade investigasse minuciosamente as origens da Covid. Em janeiro deste ano, a OMS disse que era um “imperativo moral e científico” para a China oferecer os dados e acesso necessários.

Por que se defende a hipótese de vazamento de laboratório?

Os defensores dessa ideia dizem acreditar que, se um novo coronavírus potente aparece em uma cidade que era um centro de pesquisa sobre tais patógenos, então um laboratório provavelmente foi a origem.

O trabalho do instituto de Wuhan refletia um foco crescente na ameaça representada por doenças de origem animal. Acredita-se que coronavírus zoonóticos tenham causado os surtos de Sars e Mers em 2002 e 2012. O instituto às vezes trabalhava com parceiros dos EUA em projetos financiados pelo governo americano, como experimentos de “ganho de função” de 2015 que tornaram coronavírus mais letais para fins de pesquisa.

A ideia do vazamento de laboratório tem sub-hipóteses. Uma delas é que o Sars-Cov-2 estava sendo investigado por pesquisadores depois de ter sido coletado de um morcego ou outro animal selvagem. Outra é que o patógeno foi criado a partir da modificação de um coronavírus natural. Isso poderia ter sido feito tanto por um processo de evolução artificial acelerada quanto por engenharia genética.

Os defensores da hipótese do vazamento do laboratório reconhecem que faltam provas para ratificá-la. Contudo, eles argumentam que é impossível reuni-las sem a cooperação chinesa.

“Não há uma prova definitiva, mas há suspeitas”, disse Jamie Metzl, ex-membro de um comitê consultivo da OMS sobre edição de genomas. “Há evidências circunstanciais.”

O que dizem os críticos da hipótese do vazamento de laboratório?

Muitos cientistas ainda apoiam a ideia de que o vírus da Covid-19, como outros coronavírus, surgiu em animais e depois passou para os humanos. Nesse cenário, o ponto de partida provável foi o contato entre animais selvagens e humanos em um mercado de Wuhan, onde os primeiros casos de Covid foram identificados.

Essa hipótese foi objeto de pesquisas, como uma publicada no periódico Cell em setembro do ano passado com base em amostras coletadas no Mercado de Frutos do Mar de Huanan, em Wuhan em janeiro de 2020. Ela identificou uma barraca onde todos os cotonetes com resultado positivo para Sars-Cov-2 continham vestígios de DNA de animais selvagens, mostrando que tanto os animais quanto o vírus estavam presentes no mesmo local. As amostras incluíam material genético de espécies como cães-guaxinins e civetas e ratos de bambu. Todos esses bichos haviam sido identificados como possíveis fontes de transmissão do vírus para os humanos.

“Múltiplos hospedeiros intermediários plausíveis do Sars-Cov-2 estavam presentes no local exato dentro de Wuhan ao qual o Covid-19 foi primeiramente ligado epidemiologicamente”, escreveram os pesquisadores.

Por outro lado, críticos da hipótese da origem no mercado dizem que ela é falha e dá pouco peso aos relatos de casos humanos de Covid já em novembro de 2019. Essa hipótese inclui a sugestão contestada de que houve pelo menos dois eventos separados de transmissão de animais para humanos lá, ajudando a iniciar uma epidemia.

Os cientistas por trás do estudo de setembro, por sua vez, afirmam que nenhum desses pontos enfraquece a ideia de que o mercado foi a fonte do Covid. Eles argumentam que o material genético do Sars-Cov-2 nas amostras de janeiro de 2020 poderia ter sido depositado semanas antes, algo consistente com os relatos de casos de Covid em novembro de 2019.

Florence Débarre, bióloga evolutiva e coautora da pesquisa, afirmou que uma origem no mercado era “provável, independentemente de ter havido múltiplas transmissões”.

A CIA não forneceu informações para corroborar sua avaliação de vazamento de laboratório, segundo Débarre. “Espero que os dados e a lógica que levam à conclusão da análise da agência de inteligência dos EUA sejam um dia tornados públicos”.

O debate influenciou a pesquisa de “ganho de função”?

A pesquisa de “ganho de função” envolve a manipulação de patógenos para investigar seu comportamento, melhorando propriedades como transmissibilidade e capacidade de causar doenças. O trabalho pode ser feito por razões válidas, como o desenvolvimento de vacinas ou outras formas de combater patógenos emergentes.

No entanto, esse tipo de pesquisa não tem um regime de governança internacional estabelecido.

No ano passado, o governo americano endureceu as regras sobre a pesquisa de ganho de função. Alguns especialistas argumentam que as regras revisadas, enfraquecidas a partir de um plano inicial que alguns cientistas alertaram que poderia prejudicar o trabalho com patógenos menos perigosos, têm lacunas preocupantes.

“A previsão do risco de pandemia decorrente de experimentos novos é difícil até mesmo para equipes multidisciplinares de especialistas, e um sistema de autodeclaração é inadequado, como evidenciado por incidentes passados”, escreveu Alina Chan, engenheira de vetores virais no MIT e no Broad Institute de Harvard, em um artigo publicado no mês passado.

Políticos dos EUA, como o Senador Rand Paul, há muito tempo pedem um maior escrutínio da pesquisa de “ganho de função”. O debate, assim como o sobre as origens da Covid, permanecerá altamente contestado nos próximos anos.

noticia por : UOL

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