Os dois caças mais modernos do arsenal dos Estados Unidos e da Rússia se encararam pela primeira frente a frente em um campo neutro, a Índia. Não, não foi um combate entre o F-35 e o Su-57, mas sim uma acirrada exposição das duas máquinas de guerra, dividindo um show aéreo pela primeira vez.
O encontro ocorreu na pista da base aérea de Yelahanka, em Bangalore (sul indiano), nesta segunda (10). Americanos e russos enviaram suas aeronaves para o Aero India 2025, maior show aéreo do país do premiê Narendra Modi.
Em uma vitória política do primeiro-ministro, que pratica uma política ostensiva de manter-se aliado aos EUA e à Rússia ao mesmo tempo, ambos os países enviaram seus caças da chamada quinta geração, com características furtivas ao radar, ao disputado evento.
Na hora da exibição, houve espaço para provocações mútuas. O único Su-57 enviado foi o primeiro a levantar voo e fazer sua usualmente impressionante demonstração acrobática.
Já os americanos levaram dois F-35 baseados no Alasca, onde na semana passada um caça do mesmo modelo caiu durante um treinamento. Inicialmente, segundo a mídia indiana, eles ficariam em exposição estática, mas a competição falou mais alto.
O caça fez também uma demonstração, menos vistosa do que a do rival russo, mas com direito a uma passada rasante por cima do caça de Vladimir Putin no solo. A provocação foi rebatida com um segundo voo, não previsto, do Su-57.
Quinta série à parte, as máquinas estão lá por motivos distintos. Os EUA querem consolidar sua parceria com Modi, que tem interesse na aliança com Washington para contrabalançar o peso chinês na Ásia. Ainda que em processo de degelo, as relações entre Nova Déli e Pequim são de rivalidade estratégica.
Do lado russo, é uma forma de mostrar ao mundo que o isolamento imposto pelo Ocidente devido à Guerra da Ucrânia é relativo, e reafirmar a parceria histórica com a Índia na área de defesa, algo que remonta aos tempos da União Soviética.
Apesar de atrasos de encomendas prévias devido à guerra, a Rússia conseguiu fechar na semana passada um novo e grande negócio com a Índia: a venda de mísseis de cruzeiro navais Kalibr, que são utilizados na Ucrânia.
O próprio Su-57 é um subproduto dessa aliança, embora seja um exemplo fracassado. Na origem, a versão de dois lugares do caça seria produzida em conjunto por russos e indianos, mas os altos custos de desenvolvimento e atrasos demoveram Nova Déli, que deixou o projeto em 2018.
Aos trancos e barrancos, o Su-57 voou em 2010, mas até hoje opera em números mínimos, talvez 12 dos 76 aviões encomendados. O modelo, contudo, tem sido promovido para exportação, com algumas breves passagens pelo céu da Ucrânia como cartão de visita.
Ele participou pela primeira de um show aéreo no exterior no fim do ano passado na China, outra parceira que, a exemplo da Índia, fabrica e mantém caças russos da família Su-27 sob licença de Moscou. Os chineses, contudo, já têm seus dois caças de quinta geração e testam uma nova dupla ainda mais avançada.
Lá, os russos anunciaram um primeiro contrato de exportação, para um cliente oculto que analistas dizem ser a Argélia.
Na Índia, é improvável que conquiste o mercado local, dado o histórico da relação específica. Mas como uma alternativa barata aos F-35 de quinta geração americanos, que já foram vendidos a 20 países e tiveram mil aviões fabricados, o Su-57 pode ter algum futuro em países com menos recursos na Ásia, por exemplo.
De todo modo, o F-35 também não se encaixa direito nos desejos da sempre ávida Força Área Indiana, que tem no seu coração versões locais do Su-30 e o francês Dassault Rafale.
O modelo americano, além de caro, é sujeito a limitações de venda —para piorar, Nova Déli tem baterias antiaéreas russas S-400, as mesmas cuja compra fez a Turquia ser expulsa do programa do F-35, pelo risco de revelação de segredos sobre sua furtividade ao radar.
São caças com missões distintas, contudo. O Su-57 pretende aliar superioridade aérea e características da quinta geração, ainda que menos acentuadas do que os rivais americanos, com capacidades de ataque a solo e combate ar-ar.
Sua alta manobrabilidade segue a fama dos seus antecessores. Detratores dizem que ele serve para impressionar em exibições, mas tem pouco valor militar ante a tecnologia da dupla americana F-35 e F-22, esse um caça mais pesado e poderoso. Seu fabricante, ao somar no seu número de designação os código dos dois rivais, sugere que ele pode fazer o serviço de ambos.
O Aero India vai até a sexta (14), e atrai outros atores de peso. A brasileira Embraer está presente com seu sucesso de exportação KC-390, avião de transporte multimissão que tenta emplacar como novo padrão da Força Aérea Indiana —um negócio de dezenas de unidades que, se vingar, obrigará a abertura de uma nova linha de produção para o modelo.
noticia por : UOL