A frase “quem cuida de quem cuida?” é um questionamento que vem ganhando destaque quando se fala da falta de reconhecimento das atividades exercidas por grande parte das mulheres. O “dar” conta da casa, dos filhos e da família foram por muito tempo consideradas tarefas exclusivamente femininas; tarefas estas que nunca foram remuneradas.
Conhecido como a economia do cuidado, esse conceito chama a atenção para o valor do trabalho feminino, muitas vezes realizado gratuitamente, mas de extrema importância para a manutenção da vida.
A verdade é que se todas as meninas e mulheres fossem remuneradas pelos seus trabalhos domésticos, seriam o quarto PIB do mundo, gerando anualmente, cerca de US$ 10,8 trilhões à economia global.
É o que o estudo da organização internacional Oxfam revelou em 2020. O relatório ainda aponta que, no Brasil, 90% do trabalho de cuidado é feito informalmente dentro das famílias, sendo que quase 85% da carga recai sobre o público feminino.
Uma outra pesquisa mais recente, divulgada em 2023 pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV), apontou que caso o trabalho de cuidado desempenhado pelas mulheres fosse valorado, poderia haver uma incrementação de pelo menos 13% no Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil.
Esse cenário traz diversas implicações, como a sobrecarga de tarefas domésticas, a necessidade de gerar renda, a preocupação constante com o bem-estar dos filhos e parentes, e a falta de tempo para cuidados com a saúde física e mental. Não à toa, as mães que trabalham têm 81% mais chances de sofrer com burnout, conforme aponta um estudo da Gallup divulgado em 2024.
No entanto, o ato de cuidar e estar inserida no mercado de trabalho não deve ser um obstáculo no avanço das mulheres em suas vidas pessoais e profissionais, O que elas necessitam é de condições adequadas para desempenharem suas funções e estarem onde desejam. Para isso, é essencial que haja ações coordenadas de todos os públicos e setores; homens, empresas, governo e a sociedade em geral.
O primeiro passo para transformar essa realidade é os homens reconhecerem e exercerem suas funções, equilibradas às das mulheres para que não exista sobrecarga.
Outras formas de mudar o cenário é por meio da valorização do trabalho de cuidado nas políticas públicas e nas práticas empresariais. É fundamental adotar medidas que promovam o bem-estar dos profissionais, incentivando benefícios como creches e a implementação da licença parental universal, que garante a mesma duração de licença remunerada para qualquer pessoa responsável pelo cuidado da criança.
Se não forem repensadas, as normas sociais e sexistas seguirão contribuindo para a desigualdade de gênero e econômica, acentuando cada vez mais uma disparidade, principalmente, nas atividades de cuidado. Por isso, é essencial que cada um assuma sua parcela de responsabilidade parental, ajudando a equilibrar a carga que recai desproporcionalmente sobre as mulheres.
Desde ações mais simples até as mais complexas, é possível pensar e implementar medidas de valorização do exercício do cuidado e da parentalidade, ao mesmo tempo em que impulsionam as mães, que continuam aptas a qualquer função, afinal, cuidar de um outro ser humano é curso intensivo de soft skills, pois nele aprende-se resiliência, habilidades de comunicação e negociação, capacidade de resolver problemas, gestão de tempo e criatividade.
O editor, Michael França, pede para que cada participante do espaço “Políticas e Justiça” da Folha de S. Paulo sugira uma música aos leitores. Nesse texto, a escolhida por Luciana Cattony e Susana Sefidvash Zaman foi “Desconstruindo Amélia”, de Pitty.
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noticia por : UOL