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Lula reflui no Nordeste, tensiona aliados e vê poderio eleitoral ameaçado

A queda brusca na avaliação positiva do presidente Lula (PT) entre os eleitores do Nordeste acendeu o alerta de aliados na região, impulsionou cobranças por mudanças de rota no governo e promete mexer no xadrez eleitoral de 2026.

Dados da pesquisa Datafolha divulgada no dia 14 apontam que a aprovação do presidente desabou nos últimos dois meses, saindo de 35% para 24%, menor patamar em seus três mandatos.

No Nordeste, principal reduto eleitoral do presidente, a avaliação ótima e boa de Lula caiu de 49% para 33%, maior queda regional. A região concentra um em cada quatro eleitores brasileiros e foi determinante para a vitória do petista em 2022.

A redução da popularidade acontece na esteira de uma série de desgastes do Planalto, incluindo as idas e vindas do governo na “crise do Pix” e alta na inflação dos alimentos. Esta última teve impacto na população mais pobre, refletindo em uma queda da avaliação positiva de Lula de 45% para 29% dentre os eleitores que ganham até dois salários mínimos.

No meio político, a leitura é que a memória positiva de seus dois primeiros mandatos, entre 2003 e 2010, pode ser insuficiente para garantir uma margem de votos ampla do petista na região.

O novo cenário também põe em xeque o potencial de transferência de votos do presidente em 2026, considerado essencial para a vitória de aliados nos estados em eleições anteriores.

Oito dos nove governadores de estados do Nordeste foram eleitos com o apoio de Lula em 2022. A exceção é Raquel Lyra (PSDB), de Pernambuco, que tem feito movimentos de aproximação com o petista.

Em entrevistas recentes, governadores nordestinos classificaram a queda de popularidade de Lula como passageira e reversível. Mas enfileiraram uma série de ressalvas para que a retomada aconteça.

Elmano de Freitas (PT), do Ceará, defendeu uma “mexida grande” na equipe e uma chacoalhada para acelerar das entregas. Fátima Bezerra (PT), do Rio Grande do Norte, sugeriu a Lula intensificar a presença do Nordeste. Rafael Fonteles (PT), do Piauí, disse que a comunicação precisa ser aperfeiçoada.

Em geral, a relação entre presidente e governadores é encarada como uma espécie de correia de transmissão que se retroalimenta, com perdas e ganhos para as duas partes a depender do cenário político.

De um lado, os aliados são turbinados pelo prestígio pessoal de Lula e por obras do governo federal. Aos governadores, cabe costurar as alianças, estreitando laços com líderes locais de partidos como PSD, MDB, PP e União Brasil.

A queda da popularidade do presidente, contudo, estremece um dos pilares desta relação. O cenário se torna ainda mais desafiador em meio ao freio de arrumação dado pelo STF (Supremo Tribunal Federal) nas emendas, decisão que resultou em queixas de parlamentares e prefeitos.

“O povo cobra as ações do prefeito. Quando ele não tem recursos, ele vai procurar um culpado para os problemas da saúde, das estradas vicinais. E a culpa recai sobre o presidente”, afirma o senador Angelo Coronel (PSD-BA), aliado que vive um momento de rusgas com o PT da Bahia.

Adversários veem o momento como favorável e se mobilizam de olho nas eleições de 2026. O governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil) escolheu a Bahia para lançar em abril sua pré-candidatura à Presidência. O partido faz parte da base de Lula, mas convive com dissidências internas

“O cenário atual traz uma injeção de ânimo ao campo da direita e da centro-direita, que passa a ter uma maior expectativa de vitória em 2026. Isso tem efeito político, psicológico absurdo”, afirma ACM Neto, ex-prefeito de Salvador e vice-presidente nacional do União Brasil.

Derrotado para o Governo da Bahia em 2022, ele afirma que o fator Lula teve peso determinante nos estados do Nordeste. Mas avalia que o cenário é outro: “Agora você vê um Lula com menor potencial de transferência de votos”.

Aliados reconhecem que dezembro e janeiro foram meses confusos para o governo federal e que a oposição soube encaixar seu discurso, refletindo no desgaste da imagem de Lula. Mas reiteram que o cenário não deve impactar a força que o presidente tem no Nordeste.

“A relação de Lula não é apenas com governadores ou com a classe política da região, mas com o povo nordestino. É uma relação construída em anos e anos de luta, trabalho e entrega”, avalia Éden Valadares, presidente do PT na Bahia.

Para o cientista político Paulo Fábio Dantas Neto, professor da UFBA (Universidade Federal da Bahia), uma reversão do cenário de crise do governo Lula passa por enfrentar desafios de ordem política. Dentre eles estão a falta de um horizonte programático, a dificuldade em lidar com as demandas da sociedade atual e a inabilidade na relação com o Congresso Nacional.

Outro desafio está na comunicação, considerando que o protagonismo das redes sociais tende a diminuir as discrepâncias regionais dos fenômenos eleitorais. Ou seja, a informação circula seguindo dinâmicas que reduzem o peso do contexto local.

“O Nordeste não é uma ilha, não é uma sociedade ilhada com uma própria lógica. Existem, claro, fenômenos locais com repercussões eleitorais importantes, mas há uma perda de apelo dessa lógica regional”, avalia.

Desde o início do ano, Lula fez uma única visita ao Nordeste: foi a Paramirim, cidade de 20 mil habitantes no sudoeste da Bahia. A expectativa dos aliados é de que a região esteja no roteiro das próximas viagens, com a inauguração de obras e anúncio de novos projetos.

noticia por : UOL

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