MUNDO

Novos livros ensinam a fazer arte por caminhos totalmente diferentes

Dois livros sobre o fazer artístico que tiveram carreiras editoriais de peso nos Estados Unidos saíram no Brasil pela mesma editora, a estreante Seiva, que é também uma escola de arte. “Arte e Medo: Observações sobre os Desafios (e Recompensas) de Fazer Arte”, de David Bayles e Ted Orland, e “Anatomia da História: 22 Passos para Dominar a Arte de Criar Histórias”, de John Truby.

Não poderiam ser mais diferentes um do outro. “Arte e Medo”, que os editores chamam na quarta capa de “clássico underground”, é um livro magro, ensaístico, amigável e de leitura ágil, voltado para artistas e aspirantes de qualquer meio, das artes plásticas à literatura.

“Anatomia da História” é o oposto: um livro grosso, didático, por vezes difícil e de leitura lenta, endereçado a uma carreira específica —a de roteirista.

Lançada em 1993, a obra de Bayles e Orland, ambos fotógrafos, começa com uma constatação óbvia, mas que pode soar desalentadora: “Fazer arte é difícil”.

Usa palavras simples e um tom ameno de conversa, beirando a autoajuda, para fugir tanto da teorização dos acadêmicos quanto do passo a passo dos pragmáticos. O tom se prova um acerto: o que os autores desdobram a partir daí é uma série de reflexões que cobre terreno pouco visitado por manuais de arte.

É algo difícil mesmo de abordar, por parecer estar aquém do pensamento crítico, mas que faz toda a diferença entre o sucesso e o fracasso —termos entendidos aqui em seu sentido estético e não necessariamente comercial.

Como compatibilizar as demandas da vida, externas e internas, com a decisão de dedicar tanta energia a “fazer uma coisa para a qual ninguém liga a não ser você, e para a qual talvez não haja audiência nem recompensa”?

Com exemplos tirados sobretudo de artes plásticas, literatura e música, “Arte e Medo” responde a isso com bastante bom senso e alguma argúcia. Desmistifica a ideia da arte como dom divino e enfatiza o aprendizado, mas não cai na demagogia de assegurar que qualquer um pode ser artista. Dos que começam, a maioria desiste.

O grande entrave, segundo os autores, é o medo que todos enfrentam —tanto de fracassar quanto de sondar seus próprios abismos. Se a incerteza é uma constante, a perseverança também precisa ser. “Fazer arte é como começar uma frase antes de saber como ela vai terminar.”

Enquanto “Arte e Medo” é genérico e leve, “Anatomia da História” encontra seus pontos fortes e fracos no extremo oposto do arco.

Truby tem a ambição de sistematizar o modo de contar uma história, qualquer história, e seu foco está na criação de roteiros para produtos audiovisuais, área em que trabalha como consultor.

Embora os editores vendam o livro como útil também para romancistas e contistas, trata-se de uma verdade relativa. Exercitar o escrutínio de histórias para identificar suas fraquezas e melhorá-las é algo que sempre terá valor para ficcionistas, mas “Anatomia da História”, lançado em 2007, explora o filão dos manuais de roteiro de cinema e TV que o best-seller Syd Field inaugurou nos anos 1980.

Passando por autores como Robert McKee e o próprio Truby, essa linhagem desaguou na série “Save the Cat”, de Blake Snyder, ainda sem tradução no Brasil. São manuais que atendem a uma forte demanda de mercado num país em que o setor audiovisual faz jus ao nome de indústria.

Ao lado de toques valiosos, há muitos “passos” aqui. O terceiro capítulo anuncia que a estrutura da história se resolve com sete deles, mas no oitavo descobrimos que eles se multiplicaram e agora são 22. A impressão de que estamos diante de uma receita de bolo é quase inevitável.

Quem fugir da receita e ler o livro como mais uma tentativa de sistematizar aquilo que foge a todo sistema terá muito a aprender. O maior mérito de Truby é se voltar contra fórmulas chapadas como a dos três atos de Syd Field (“terrivelmente simplista”) e se orientar pela ideia de que “uma ótima história é orgânica —não uma máquina, mas um corpo vivente que se desenvolve”.

noticia por : UOL

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