“Um guia pouco convencional para perder gordura depressa, ter uma vida sexual incrível e se tornar um super-humano”, diz o subtítulo de “4 horas para o corpo”, best-seller que acaba de ganhar uma nova edição no Brasil pela Intrínseca.
Exageros à parte, o fato é que o livro do empresário e palestrante americano Tim Ferriss conquistou leitores mundo afora porque explica com simplicidade como é possível obter os melhores resultados a partir do mínimo esforço.
Soluções fáceis e eficientes para questões que afetam a maioria das pessoas (como o desejo de emagrecer, tornar o corpo mais musculoso ou dormir melhor) são apresentadas a partir de histórias de atletas, fisiculturistas, médicos e pessoas que nada têm a ver com o universo da saúde — como o personagem que dá o seu depoimento no trecho a seguir.
Para a maioria de nós, os livros de autoajuda em nossas estantes representam uma lista crescente de afazeres, e não de conselhos que seguimos.
Vários dos mais conhecidos CEOs do ramo de tecnologia de San Francisco me pediram, em momentos diferentes, o mesmo favor: um cartão com instruções resumidas para que conseguissem eliminar a gordura abdominal.
Cada um deles foi muito objetivo: “Simplesmente me diga o que fazer e eu o farei”.
Dei a todos eles os conselhos táticos necessários, escritos em cartões de 8 × 13 cm, sabendo, de antemão, o resultado. E a taxa de sucesso foi impressionante… 0%.
As pessoas são péssimas em seguir conselhos. Mesmo os indivíduos mais eficientes do mundo são terríveis nisso, e há dois motivos:
- 1. A maioria das pessoas não tem motivos suficientes para agir. A dor não é tanta assim. Ou é algo que seria bom, e não necessário. Não há um “Momento Harajuku”.
- 2. Não existem lembretes. Sem acompanhamento constante, não há consciência nem mudança comportamental. O acompanhamento constante, mesmo que você não tenha nenhum conhecimento sobre perda de gordura ou exercícios, geralmente funciona mais que os conselhos dos melhores treinadores do mundo.
Mas o que é esse tão importante “Momento Harajuku”? É uma epifania que transforma aquilo que seria bom em algo necessário.
Não há sentido em se começar até que isso aconteça. E se aplica à perda de gordura, assim como ao ganho de resistência, à força e ao sexo.
Não importa quantas dicas e receitas eu lhe forneça, você precisará de um “Momento Harajuku” para despertar a mudança de atitude em si. Chad Fowler sabe disso.
Chad, CTO [Chief Technology Officer, ou diretor de tecnologia] da InfoEther, Inc., passa boa parte do tempo resolvendo para seus clientes problemas difíceis na linguagem de programação Ruby. Ele também é co-organizador das conferências anuais RubyConf e RailsConf, nas quais o conheci.
Nosso segundo encontro foi em Boulder, no Colorado, onde ele usava sua experiência natural com a língua hindi para ensinar a um homem das cavernas (eu) os ensinamentos básicos da linguagem Ruby.
Chad é um professor incrível, que sabe fazer uso de analogias, mas eu me distraí durante sua aula por causa de algo que ele mencionou de passagem. Ele havia perdido recentemente mais de 30 kg em menos de 12 meses.
Não foi a quantidade de peso que achei fascinante. Foi o tempo. Ele fora obeso por mais de uma década, e a mudança parecia ter surgido do nada.
Depois de voltar a San Francisco, enviei-lhe uma pergunta por e-mail: “Quais foram os fatos marcantes, os momentos e os insights que o levaram a perder aqueles 30 kg?”.
Eu queria saber qual fora o momento decisivo, a conversa ou a percepção que acionou o gatilho depois de dez anos vivendo daquela forma. A resposta está neste capítulo.
Mesmo que você não esteja interessado em eliminar gordura, as ideias fundamentais (completude parcial, dados e simplificação excessiva, entre outras coisas) o ajudarão a erguer 230 kg, correr 50 km, ganhar mais de 20 kg ou fazer qualquer outra coisa mencionada neste livro.
Por ora, tratemos de algo que causa estranheza desde já: a contagem de calorias. Acabei de jogar no lixo a contagem de calorias e estou incluindo aqui a abordagem de Chad, que se baseia nas calorias, para provar minha teoria.
Este livro não existia quando Chad emagreceu, e há coisas muito melhores do que calorias para se contar. Entretanto, eu recomendaria o controle das calorias como alternativa mais eficaz do que não controlar nada? Pode apostar que sim.
Controlar qualquer coisa é melhor do que não controlar nada. Se você estiver muito acima do peso, muito fraco, sem flexibilidade alguma ou muito qualquer coisa negativa, controlar até mesmo uma variável medíocre o ajudará a desenvolver a consciência que conduz às alterações comportamentais certas.
Isso ressalta uma lição estimulante: você não precisa fazer tudo certo. Só deve ser muito objetivo em relação a alguns conceitos. Os resultados surgirão. Com vocês, a resposta de Chad Fowler.
O Momento Harajuku
“Por que passei dez anos perdendo o controle de minha forma física (e me tornando uma pessoa nada saudável) para, finalmente, resolver esse problema agora? Eu me lembro exatamente do momento em que decidi tomar uma atitude.
Estava em Tóquio com um grupo de amigos, e todos nós decidimos ir a Harajuku [bairro japonês conhecido internacionalmente como um centro de cultura e moda jovem] para tentar ver jovens vestidos de modo artístico e também para comprar roupas fabulosas, pois a região é famosa por isso.
Algumas pessoas do grupo se vestiam muito bem e sabiam o que comprar. Depois de entrar em várias lojas e sair delas sem conseguir encontrar nada, um de meus amigos e eu desistimos e simplesmente ficamos do lado de fora enquanto os demais faziam compras.
Nós dois lamentamos nossa falta de estilo. Foi então que me vi dizendo para meu amigo o seguinte: “Para mim, não importa o que eu visto. Não vai cair bem mesmo”.
Acho que ele concordou comigo. Não me lembro ao certo, mas essa não é a questão.
A questão era que aquelas palavras ficaram pairando no ar como quando você diz algo muito vergonhoso num ambiente barulhento durante o único instante de silêncio da noite. Todos olham para você como se você fosse um idiota.
Mas dessa vez era eu que estava encarando a mim mesmo com reprovação. Eu me ouvi dizer aquelas palavras e as reconheci não pelo conteúdo, e sim pelo tom de impotência.
Sou, na maioria dos meus empreendimentos, uma pessoa extremamente bem-sucedida. Decido que quero as coisas de certo modo e faço tudo acontecer.
Foi o que fiz com minha carreira, o que fiz quando quis aprender música e línguas estrangeiras e basicamente com tudo o mais que tentei realizar
Por muito tempo, eu soube que o segredo para trilhar o caminho para ser notável em tudo era simplesmente agir com a intenção de se destacar. Se eu queria uma carreira acima da média, não podia simplesmente ‘seguir a boiada’.
A maior parte das pessoas faz justamente isto: deseja obter um resultado, mas não toma atitudes para atingir tal resultado. Se fizessem qualquer coisa, descobririam ser capazes de conseguir uma versão do resultado que almejam.
Este sempre foi meu segredo: parar de desejar e começar a agir. Mesmo assim lá estava eu, conversando sobre aquela que supostamente era a parte mais importante da minha vida — minha saúde — como se fosse algo sobre o qual eu não exercesse qualquer controle.
Segui a boiada durante anos, desejando um resultado e esperando que ele acontecesse. Eu era o ego fraco e impotente que tanto odeio nas pessoas.
De algum modo, como o nerd que era sempre escolhido por último em tudo, eu havia permitido que “não ser bom em esportes” e “não estar em forma” se tornassem parte dos atributos que considerava inerentes a mim mesmo.
O resultado disso foi que passei a me ver como uma pessoa incompleta. Apesar de eu (talvez) ter compensado essa incompletude vencendo em tudo mais, ainda carregava essa impotência; e era algo que, lenta e sutilmente, estava me consumindo por dentro.
Assim, embora seja verdade que eu não teria ficado lindo em roupas da moda, o catalisador aparentemente superficial que me levou a finalmente fazer alguma coisa não era de todo superficial.
Ele na verdade arrancou uma raiz profunda que estivera, acredito eu, guiando parte importante da minha personalidade durante toda a minha vida. Agora percebo que isso é um padrão.
No meio em que vivo (programadores de computador e pessoas ligadas à tecnologia), essa incompletude parcial não só é comum como talvez seja até mesmo a regra.
Ultimamente minha vida assumiu um novo foco: arrancar as ervas daninhas, ver os buracos que eu não notava em mim mesmo Agora estou preenchendo um de cada vez.
Depois que comecei a perder peso, o processo todo não foi apenas fácil, mas também prazeroso. Comecei de leve, simplesmente prestando atenção à alimentação e fazendo exercícios aeróbicos leves de três a quatro vezes por semana.
Foi quando comecei a pensar em melhorar, em fazer um pouco melhor do que no dia anterior. No primeiro dia foi fácil. Qualquer exercício era melhor do que aquilo que eu vinha fazendo.
Se você perguntar a uma pessoa obesa “se você fosse capaz de fazer exercícios durante UM ano para conseguir ficar em forma, você o faria?”, acho que todos diriam enfaticamente que sim.
O problema é que, para a maioria das pessoas normais, não existe um caminho definido que as leve da obesidade à boa forma em apenas um ano. Para quase todo mundo, o caminho está logo ali e é óbvio se a pessoa souber o que está fazendo, mas é quase impossível imaginar um resultado tão distante como esse.
A primeira coisa que me levou a ser capaz de continuar com o treinamento e tomar as decisões certas foi usar dados. Aprendi tudo sobre a taxa metabólica basal (TMB), também chamada de metabolismo basal, e fiquei impressionado quando soube quantas calorias precisaria ingerir para manter aquele peso. Era muita coisa.
À medida que comecei a ficar atento às calorias dos alimentos que não eram obviamente ruins, senti como se tivesse que me alimentar como um glutão o dia inteiro se quisesse permanecer gordo.
A TMB me mostrou que não seria difícil diminuir as calorias e que eu devo ter cometido ENORMES erros para consumir tantas calorias assim — e não erros pequenos. Contudo, essa era uma boa notícia. Grandes erros significavam que meus objetivos seriam mais fáceis de alcançar.
Depois, aprendi que 4 mil calorias equivalem a aproximadamente 500 g de gordura. Sei que é uma simplificação grosseira, mas tudo bem. Simplificar é um dos instrumentos que mencionarei.
Entretanto, se 4 mil calorias equivaliam a cerca de 500 g de gordura e minha TMB tornava fácil a queima de muitas calorias por dia, de repente ficou evidente para mim como perder peso sem sequer me exercitar.
Acrescente a isso alguns cálculos de quantas calorias você elimina fazendo, digamos, 30 minutos de exercício e você obterá rapidamente uma fórmula parecida com esta:
TMB = 2.900
Ingestão real = 1.800
Déficit calórico = TMB – ingestão real = 1.100
Calorias consumidas durante 30 minutos de exercício aeróbico = 500
Déficit total calórico = déficit calórico + calorias consumidas durante 30 minutos de exercício aeróbico = 1.600
Ou seja, essas são as 1.600 calorias que deixei de consumir por dia, ou quase 250 g de peso extra que eu podia perder num único dia. Assim, arredondando os números, posso perder 2,3 kg em uma semana e meia sem nem mesmo fazer muito esforço.
Quando você está 20 kg acima do peso, alcançar 10% do seu objetivo com tamanha rapidez faz toda a diferença.
Uma coisa importante que mencionei antes é que todos esses números são, de certo modo, besteira. Mas tudo bem, e constatar que está tudo bem foi uma das maiores mudanças que precisei enfrentar.
Quando você está com um sobrepeso de 20 ou 30 kg (ou sempre que tiver de passar por uma mudança DRÁSTICA), ficar se preocupando em contar calorias consumidas ou queimadas de uma maneira ligeiramente imprecisa pode matá-lo.
A verdade é que não existem instrumentos disponíveis para pessoas comuns que digam com precisão quanta energia queimamos ou consumimos. No entanto, se você estiver apenas quase certo e, mais importante, se os números estiverem na direção certa, dá para fazer grande diferença com eles.
Eis outro número pseudocientífico útil: aparentemente, 5 kg perdidos equivalem a um número de roupa [XG – G – M]. Isso foi uma GRANDE motivação. Adoro doar roupas todos os anos e comprar novas sem culpa.
Como um nerd, fico desencorajado demais por projetos de coleta de dados quando é difícil ou impossível reuni-los precisamente. Educar-me para esquecer isso fez toda a diferença.
Além desse conhecimento, havia um entendimento básico de como o metabolismo funciona. Eis aqui as principais mudanças que fiz: café da manhã até 30 minutos depois de acordar e de cinco a seis refeições ao dia, com cerca de 200 calorias cada.
Como medi as calorias? Não medi. Criei um plano de refeições para somente UMA semana, comprei todos os ingredientes e segui a dieta com rigor. A partir daí, não precisei mais me esforçar tanto.
Aprendi, depois de apenas uma semana, a contar aproximadamente quantas calorias havia numa porção de diferentes tipos de alimentos e passei a chutar. Mais uma vez, tentar contar as calorias uma a uma é chato e desmotivante.
Montar um esquema rígido para uma semana e depois usá-lo como um guia básico é sustentável e divertido. Aí vão mais algumas dicas:
Adaptei uma mesa para poder pedalar numa bicicleta reclinável enquanto trabalhava. Trabalhei de verdade, escrevi trechos do livro The Passionate Programmer [‘O programador apaixonado’], joguei videogame, conversei com amigos e assisti a ridículos programas de televisão com os quais normalmente teria vergonha de perder tempo, tudo durante meu exercício aeróbico.
Conheço muitas pessoas criativas que odeiam exercícios porque os consideram entediantes. Eu fazia parte desse grupo (não faço mais… tudo muda depois que você pega o espírito da coisa).
A bicicleta/mesa me salvou — aliada a um sistema de medidas. Comprei um frequencímetro e comecei a utilizá-lo para TUDO. Usei-o pedalando para ter certeza de que, mesmo quando estava me divertindo com um videogame, aquilo me fazia bem.
Se você sabe os limites da sua frequência cardíaca (algo fácil de encontrar na internet), desaparece a ambiguidade que as pessoas que não são especialistas em preparo físico sentem em relação aos exercícios.
Trinta minutos de atividade dentro da sua zona aeróbica são um bom exercício e fazem queimar gordura. Calcule quantas calorias você queima (um bom frequencímetro fará isso por você), e a experiência será divertida e motivante.
Comecei a usar meu frequencímetro enquanto realizava tarefas domésticas irritantes. Você pode limpar a casa mais rápido e queimar muitas calorias. Não é besteira — é sério.
Graças ao uso constante do frequencímetro, fui capaz de combinar diversão ou tarefas irritantes com exercícios, tornando tudo muito mais recompensador e reduzindo as chances de ficar com preguiça e decidir não fazer nada.
Ganhar músculos é, como você sabe, uma das melhores maneiras de se queimar gordura, mas nerds não sabem como ganhar músculo. Já mencionei antes: nerds não gostam de fazer aquilo que não sabem se dará certo. Gostamos de dados. Valorizamos a experiência.
Assim, contratei uma personal trainer para me ensinar o que fazer. Acho que devia tê-la dispensado depois de algumas sessões, uma vez que já havia aprendido os exercícios “certos”, mas estou com ela há um ano inteiro.
Por fim, como um amigo me disse sobre a dificuldade de escrever meus insights quanto à perda de peso, um insight fundamental é a falta de insights específicos. De certa forma, a resposta é apenas “dieta e exercícios”. Não houve truques.
Usei dados aos quais todos nós temos acesso e confiei que a biologia faria sua mágica. Experimentei durante 20 dias e perdi quantidade significativa de peso. Melhor ainda, comecei a acordar pensando em me exercitar porque me sentia melhor. Foi fácil.”
Foi fácil para Chad por causa do seu Momento Harajuku. Deu certo porque ele usou números. É aí que a diversão começa.
noticia por : Gazeta do Povo