VARIEDADES

Principais empresas americanas apostam em ação afirmativa, mas a moda está passando

Em meados de 2020, os Estados Unidos entraram numa febre
racial após o óbito de George Floyd, um homem negro que teve sua morte por
sufocamento pela polícia documentada com um vídeo. Protestos de rua levaram a
mais mortes e a um prejuízo de bilhões de dólares. Casos similares anteriores com
vítimas brancas, como Tony Timpa, bem como estatísticas do FBI sobre o problema,
que indicam que pessoas negras não
são alvo desproporcional de violência policial no país
, foram ignorados na
narrativa do movimento Black Lives Matter (“vidas negras são
importantes”).

Empresas e personalidades famosas postaram quadros de luto no Instagram. A pressão por mais políticas identitárias de raça cresceu vertiginosamente. E deu resultados: uma nova análise da agência de notícias Bloomberg publicada no dia 25 de setembro revelou que, de mais de 300 mil vagas de emprego ofertadas pelas 88 mais lucrativas empresas americanas em 2021, somente 6% foram para pessoas autodeclaradas brancas. A ampla maioria de 94% foi para não-brancos, frequentemente com algum tipo de política de cotas. Segundo o Censo de 2020 dos EUA, o país tem 57,8% de brancos na população.

As empresas selecionadas são do índice S&P 100, mantido
pela especialista em análise de mercado Standard & Poor’s. Elas
representam mais de metade da capitalização do mercado de ações dos Estados
Unidos. Incluem nomes como
Apple, Amazon, American Express, BlackRock, Boeing, Citigroup, Disney, Ford, Google,
IBM, Intel, Johnson & Johnson, Facebook, Microsoft, Nike, Pfizer, Visa e
Walmart.

No ano de 2021, essas empresas ofertaram 323.094 vagas de emprego. Em conjunto, sua força de trabalho é de mais de 9 milhões de americanos. Não há dados ainda para 2022 e 2023. Por lei, empresas americanas com 100 funcionários ou mais devem informar ao governo a composição demográfica de sua força de trabalho. Dessas vagas, 20.524 foram para pessoas brancas, e 302.570 para pessoas não-brancas (classificadas como hispânicas, asiáticas e negras). O influxo das minorias raciais foi principalmente para posições de entrada, que não exigem diploma. Ainda foi expressivo entre vagas profissionais (que exigem diploma), de gerência e entre executivos no topo do comando. Nos cargos mais altos, contudo, o crescimento foi de 2% — nesse alto escalão, pessoas brancas estão presentes acima de sua porcentagem censitária. Entre executivos, metade das novas vagas foram para não-brancos.

Uma crítica à análise da Bloomberg veio da empresa de mídia conservadora Daily Wire, que disse que as conclusões da primeira são “um exemplo de analfabetismo matemático de jornalistas”. Em uma reanálise dos dados, a empresa afirma que a distribuição racial das contratações de 2021 “mal diferiu dos anos anteriores”. A porcentagem de novos empregos que foram para brancos na verdade teria sido de 46%, oito pontos percentuais abaixo dos 54% que compõem a força de trabalho atual daquelas empresas. “A Bloomberg, tentando achar um modo de isolar os números recentes, (…) errou o denominador da fração”. Os números da Bloomberg são baseados na comparação do quadro total das empresas em 2020 e 2021. Ao isolar somente o excedente de vagas no crescimento das empresas, isso ignora a quantidade de substituições de vagas já existentes, que a Daily Wire calcula que é de quase dois milhões. Contudo, os números ainda refletem uma queda nos contratados brancos, que resulta também das mudanças demográficas no país, não apenas da ação afirmativa.

Intelectual negro que pede volta do tratamento igual tem palestra
prejudicada por famosa empresa dedicada a “ideias dignas de partilha”

A premissa do tratamento diferenciado em contratações é a de
que disparidades estatísticas — entre a presença proporcional de um grupo na
população em geral e sua presença rarefeita em ambientes como universidades e
empresas — seriam prova automática de discriminação e preconceito.

O economista e filósofo americano Thomas Sowell, ainda em
atividade aos 93 anos, disputa essa premissa no livro “Ação Afirmativa ao Redor
do Mundo” (É Realizações, 2017). Ele conta, por exemplo, que uma quantidade
“desproporcional” dos produtores de cerveja, até mesmo da marca chinesa
Tsingtao, é de alemães. Produzir cerveja faz parte de sua cultura, a
“sobrerrepresentação” de alemães nessa indústria não tem nada de questionável.
Ele também aponta que a criação de tratamento diferenciado infla os números dos
contemplados, pois as pessoas passam a usar ligação tênue aos grupos
identitários favorecidos para reinterpretar sua identidade. Uma política que
favorecia os aborígenes na Austrália, por exemplo, aumentou sua população em
40% no curso de meia década — uma improbabilidade biológica.

Outro crítico do tratamento diferenciado é o jovem
intelectual independente Coleman Hughes. Nos Estados Unidos, a postura de
tratar as pessoas como se não tivessem cores diferentes ou como se suas cores
fossem irrelevantes é conhecida como “color blindness” (“cegueira à cor” ou
“daltonismo”). O termo foi criado por um abolicionista, como apontou Hughes em
uma curta palestra de menos de 15 minutos feita a pedido da empresa TED, conhecida
na Internet por publicar vídeos desse tipo de seminário. Mas os atuais
movimentos identitários de raça detestam o termo e a ideia de tratamento igual.

No mês passado, o intelectual, que é negro, acusou
a TED de propositalmente desenfatizar a divulgação de sua palestra em seu
próprio site após um grupo de funcionários da empresa, “Black@TED” (algo como
“Negros na TED”) alegar estar ofendido com sua fala, um dia após a gravação.
Ele se ofereceu para conversar, mas o grupo se recusou, apesar das reclamações.
O chefe da empresa, Chris Anderson, pediu que Hughes aceitasse publicar a
palestra com um debate de contraponto, um pedido sem precedentes. Anderson
respondeu às acusações: “sou fã do Coleman”, disse
ele no X (Twitter). “Sim, houve controvérsia. Quando pessoas da nossa equipe
sentem que sua identidade está sob ataque, é correto fazer uma pausa. (…)
Alguém foi censurado, aqui? Não.”

Indústria da diversidade está em colapso

Outro desenvolvimento pós-Floyd e BLM foi a criação de um
Centro de Pesquisa Antirracista na Universidade de Boston, em 2020. Foram
investidos 43 milhões de dólares no centro, 10 milhões dos quais vieram de Jack
Dorsey, o fundador e ex-diretor executivo do Twitter.  Foi escolhido para chefiar o centro o
intelectual Ibram X. Kendi, autor
do livro infantil “Bebê Antirracista”
. Três anos depois, o centro entrou em
colapso, entregando muito pouco para o montante investido e tendo de demitir
mais da metade de seus funcionários, alguns dos quais alegam ter sido vítimas
de exploração. A universidade abriu uma investigação a respeito. Enquanto isso,
Kendi iniciou um novo programa de análise de racismo no canal de esporte ESPN,
que pertence ao grupo Disney.

Outra movimentação de 2020 foi a abertura de muitas vagas para profissionais de “diversidade, equidade e inclusão” (DEI) nas empresas. Uma pesquisa da firma de análise Revelio Labs mostrou que, pressionadas pela ressaca econômica durante e depois da pandemia, as empresas, especialmente as de tecnologia, começaram a demitir esses profissionais. As demissões estão acontecendo “a uma taxa mais rápida que em empregos não-DEI”. Foram contabilizados mais de 300 demitidos no segundo semestre de 2022. A America Airlines, por exemplo, reduziu em 3% as contratações por cotas no mesmo período.

A matéria foi atualizada para incluir a crítica da Daily Wire à análise da Bloomberg. Alteramos o título para melhor refletir a incerteza sobre os números da Bloomberg, e corrigimos uma estatística incorretamente transcrita.

Corrigido em 05/10/2023 às 11:10

noticia por : Gazeta do Povo

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